(Desculpem... o tempo para editar o blog, com todos os materiais que vamos recolhendo em muitas das nossas celebrações, tem sido quase zero. Mas não resisti a colocar já esta belíssima mensagem de Natal!...)
segunda-feira, dezembro 22
quarta-feira, dezembro 10
comunidade
"Gostaria de viver numa comunidade onde em grande espírito de verdade, simplicidade, liberdade e amor, fosse capaz de pôr em comum e participar de interrogações e experiências, no diálogo com o mistério que é o estofo do homem, do mundo e de Deus. Onde eu fosse capaz de viver a fé que é esta exacta capacidade de simultaneamente participar de Deus e estar separado dele. Onde fosse possível viver a esperança, que é a consciência aguda e sem ilusões da nossa insuficiênciam e da insuficiência do mundo e a simultânea confiança no nosso espírito e no santo espírito de Deus. Uma comunidade onde a presença dos outros fosse um apelo constante às diversas formas de amor para que, a pouco e pouco, a nossa experiência alargada fosse uma constante relação amorosa que por aí pudesse encontrar o amor de Deus.
Gostaria que nessa comunidade, ao menos uma vez em cada semana, me fosse dado viver, em plena consciência e participação, a renovação do mistério de Deus que se fez homem e que pelos homens morreu numa cruz. Que à volta duma mesa fosse possível criar um clima de grande verdade interior, que sinceramente me desse consciência da minha fraqueza e da grandeza e da glória daquilo para que fui chamado. Onde, nesse espírito, pudesse reflectir na palavra revelada; onde recolhesse as mais recônditas disponibilidades do meu espírito e as oferecesse sinceramente para o melhor uso que pudessem ter. Onde recolhidamente lembrassse os vivos e aquilo que de nós concretamente esperam. Onde comparticipasse na consagração do pão e do vinho da terra. Onde lembrasse os mortos e aquilo que lhes devo e soubesse dirigir a prece ao Pai na procura da sua vontade e recebesse contente o pão de cada dia. E onde, partilhando do pão e do vinho, com eles recebesse a paz.
Gostaria que o meu espírito se abrisse em disponibilidade total, de modo a que, naturalmente, saudasse os outros homens desejando-lhes a paz: "Que Deus te dê paz". E que isso preparasse o dia em que eu, serenamente, se não com alegria, pudesse dizer: "Benvinda sejas, morte, minha irmã".
António Alçada Baptista
Peregrinação Interior - Vol. 1: Reflexões sobre Deus
domingo, dezembro 7
Baptismo do João Martim - 2º Domingo do Advento
Neste segundo Domingo do Advento, acolhemos o João Martim na Igreja-Comunidade que também nós construímos, dia-a-dia. As pequenas (agora...) mãos do João passarão, a partir de hoje, a construir connosco esta Igreja que se quer Testemunho do Deus Vivo, do Deus que se fez (vai fazer...) Menino!
Aqui fica a Celebração que preparámos para o João, juntamente com os seus Pais.
"Só se vê bem com o coração.
O essencial é invisível para os olhos."
(Antoine de Saint-Exupéry, O Principezinho)
1 - Cântico de entrada — TU QUE TENS
Canta, canta como uma ave ou um rio,
Dá o teu braço aos que querem sonhar
Quem trouxer mãos livres ou um assobio
Nem é preciso que saiba cantar.
Tu que tens dez reis de esperança e amor
Grita bem alto que queres viver.
Compra pão e vinho mas rouba uma flor
Tudo o que é belo não é de vender
Não vendem ondas do mar
Nem brisa ou estrelas
Sol ou lua cheia.
Não vendem moças de amar
Nem certas janelas
Em dunas de areia.
Canta, canta (…)
Tu que crês num mundo maior e melhor
Grita bem alto que o céu está aqui.
Tu que vês irmãos só irmãos em redor
Crê que esse mundo começa por ti.
Traz uma viola um poema
Um passo de dança
Um sonho maduro.
Canta glosando este tema:
Em cada criança
Há um homem puro
Canta, canta (…)
2 - Saudação do presidente da celebração
3 - Apresentação do João
4 - Primeira leitura
Principezinho
Foi então que apareceu a raposa:- Bom dia, disse a raposa.
- Bom dia, respondeu o principezinho com delicadeza. Mas ao voltar-se não viu ninguém.
- Estou aqui, disse a voz, debaixo da macieira.
- Quem és tu?, disse o principezinho. És bem bonita…
- Sou uma raposa, disse a raposa.
- Anda brincar comigo, propôs-lhe o principezinho. Estou tão triste…
- Não posso brincar contigo, disse a raposa. Ainda ninguém me cativou.
- Ah! Perdão, disse o principezinho.
Mas depois de ter reflectido, acrescentou:
- Que significa “cativar”?
- Tu não deves ser de aqui, disse a raposa. Que procuras?
- Procuro os homens, disse o principezinho. Que significa “cativar”?
- Os homens, disse a raposa, têm espingardas e caçam. É uma maçada! Também criam galinhas. É o único interesse que lhes acho. Andas à procura de galinhas?
- Não, disse o principezinho. Ando à procuro amigos. Que significa “cativar”?
- É uma coisa de que toda a gente se esqueceu, disse a raposa, Significa “criar laços…”
- Criar laços?
- Isso mesmo, disse a raposa. Para mim, não passas por enquanto, de um rapazinho em tudo igual a cem mil rapazinhos. E eu não preciso de ti. E tu não precisas de mim. Para ti, não passo de uma raposa igual a cem mil raposas. Mas, se me cativares, precisaremos um do outro. Serás para mim único no mundo. Serei única no mundo para ti…
- Começo a compreender, disse o principezinho. Existe uma flor… creio que ela me cativou…
- É possível. - disse a raposa. - Vê-se de tudo à superfície da Terra…
- Oh! Não foi na Terra, disse o principezinho.
A raposa mostrou-se muito intrigada.
- Noutro planeta?
- Sim.
- Há caçadores nesse tal planeta?
- Não
- Isso tem muito interesse. E galinhas?
- Não
- A perfeição não existe, suspirou a raposa.
Mas voltou à mesma ideia.
- Levo uma vida monótona. Eu caço as galinhas e os homens caçam-me a mim. Todas as galinhas são iguais e todos os homens são iguais. Por isso me aborreço um pouco. Mas, se tu me cativares, será como se o Sol iluminasse a minha vida. Distinguirei, de todos os passos, um novo ruído de passos. Os outros passos fazem-me esconder debaixo da terra. Os teus hão-de atrair-me para fora da toca, como música. E depois, olha! Vês, lá adiante, os campos de trigo? Eu não como pão. O trigo para mim é inútil. Os campos de trigo não me dizem nada. E é triste! Mas os teus cabelos são cor de oiro. Por isso, quando me tiveres cativado, vai ser maravilhoso. Como o trigo é doirado, fará lembrar-me de ti. E hei-de amar o barulho do vento através do trigo…
A raposa calou-se e olhou por muito tempo o principezinho.
- Cativa-me, por favor, disse ela.
- Tenho muito gosto, respondeu o principezinho, mas falta-me tempo. Preciso de descobrir amigos e conhecer muitas.
- Só se conhecem as coisas que cativam, disse a raposa. Os homens não têm muito tempo para tomar conhecimento de nada. Compram coisas feitas aos mercadores. Mas como não existem mercadores de amigos, os homens já não têm amigos. Se queres um amigo, cativa-me!
- Como é que hei-de fazer?, disse o principezinho.
- tens de ter muita paciência, respondeu a raposa. Primeiro, sentas-te um pouco afastado de mim, assim, na relva. Eu olho para ti pelo cantinho do olho e tu não dizes nada. A linguagem é uma fonte de mal-entendidos. Mas, de dia para dia, podes sentar-te cada vez mais perto…
No dia seguinte, o principezinho voltou.
- Era melhor teres vindo à mesma hora, disse a raposa. Se vieres, por exemplo, às quatro horas da tarde, às três já eu começo a ser feliz. À medida que o tempo avançar, mais feliz me sentirei. Às quatro horas já começarei a agitar-me e a inquietar-me; descobrirei o preço da felicidade. Mas se vieres a uma hora qualquer, nunca posso saber a horas hei-de vestir o meu coração… São preciso ritos.
- O que é um rito? disse o principezinho.
- É também qualquer coisa de que toda a gente se esqueceu, disse a raposa. É o que faz com que um dia seja diferente dos outros dias, uma hora diferente das outras horas. Há um rito, por exemplo, entre os meus caçadores. Dançam às quintas-feiras com as raparigas da aldeia. A quinta-feira é, por isso, um dia maravilhoso! Vou passear até à vinha. Se os caçadores dançassem num dia qualquer, os dias seriam todos iguais, e eu não teria férias.
Foi assim que o principezinho cativou a raposa. E quando se aproximou a hora da partida:
- Ah! disse a raposa… Vou chorar.
- A culpa é tua, disse o principezinho, não queria que te acontecesse mal; mas tu quiseste que eu te cativasse…
- É certo, disse a raposa.
- Mas vais chorar!, disse o principezinho.
- É certo, disse a raposa.
- Então não ganhas nada com isso!
- Ganho, sim, disse a raposa, por causa da cor do trigo.
Depois acrescentou:
- Vai ver as outras rosas. Compreenderás que a tua é única no mundo. Quando voltares para me dizer adeus, faço-te presente de um segredo.
O principezinho foi ver as outras rosas.
- Vós não sois nada parecidas com a minha rosa; ainda não sois nada, disse-lhes ele. Ninguém vos cativou, nem vós cativastes ninguém. Sois como era a minha raposa. Não passava de uma raposa igual a cem mil raposas. Mas fiz dela minha amiga e agora é única no mundo.
E as rosas ficaram bastante aborrecidas:
- Vós sois belas, mas vazias, disse-lhes mais. Ninguém vai morrer por vós. É certo que, quanto à minha rosa, qualquer vulgar transeunte julgará que ela se vos assemelha. Mas, sozinha, ela vale mais do que vós todas juntas, porque foi ela que eu reguei. Porque foi ela que eu pus numa redoma. Porque foi ela que abriguei com um biombo. Porque foi por causa dela que matei as lagartas (excepto duas ou três para as borboletas). Porque foi ela e só ela que ouvi lamentar-se ou gabar-se, ou mesmo, por vezes calar-se. Porque é a minha rosa.
E voltando para junto da raposa:
- Adeus, disse ele.
- Adeus, disse a raposa. Vou dizer-te um segredo. É muito simples: só se vê bem com o coração. O essencial é invisível para os olhos.
- O essencial é invisível para os olhos, repetiu o principezinho, a fim de se recordar.
- Foi o tempo que perdeste com a tua rosa que tornou a tua rosa tão importante.
- Foi o tempo que perdi com a minha rosa… repetiu o principezinho, a fim de se recordar.
- Os homens esqueceram esta verdade. mas tu não deves esquecê-la. Ficas para sempre responsável por aquele que cativaste. És responsável pela tua rosa.
- Sou responsável pela minha rosa, repetiu o principezinho a fim de se recordar.”
5 - Aleluia
6 - EVANGELHO – Mc 1, 1-8 (com Isaías, Is 40, 1-5.9-11)
Princípio do Evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus.
Está escrito no profeta Isaías: «Vou enviar à tua frente o meu mensageiro, que preparará o teu caminho.
Uma voz clama no deserto:
«Preparai no deserto o caminho do Senhor, abri na estepe uma estrada para o nosso Deus. Sejam alteados todos os vales e abatidos os montes e as colinas; endireitem-se os caminhos tortuosos e aplanem-se as veredas escarpadas. Então se manifestará a glória do Senhor e todo o homem verá a sua magnificência, porque a boca do Senhor falou”.
Apareceu João Baptista no deserto a proclamar um baptismo de penitência para remissão dos pecados. Acorria a ele toda a gente da região da Judeia e todos os habitantes de Jerusalém e eram baptizados por ele no rio Jordão, confessando os seus pecados. João vestia-se de pêlos de camelo, com um cinto de cabedal em volta dos rins, e alimentava-se de gafanhotos e mel silvestre. E, na sua pregação, dizia: «Vai chegar depois de mim quem é mais forte do que eu, diante do qual eu não sou digno de me inclinar para desatar as correias das suas sandálias. Eu baptizo-vos na água, mas Ele baptizar-vos-á no Espírito Santo».
7 - Celebração do Baptismo do João
7.1 - Acolhimento
Pe. Samelo — O que se vem hoje pedir à Igreja através desta Comunidade é o Baptismo do João. Pedir o Baptismo é pedir para pertencer à Igreja da Trindade e viver de acordo com a alegria e amor aos outros que Jesus Cristo anunciou. Então lembremo-nos sempre, no fundo do nosso coração, que amar é acreditar, amar é nunca trair, amar é estar às ordens, amar é dizer não ao egoísmo, amar é procurar a nossa felicidade em Deus, nos outros e na natureza.
Pais e padrinhos, estais dispostos a ajudar o João a crescer segundo estes valores?
Pais e Padrinhos — Sim, estamos.
Pe. Samelo — E esta Comunidade, que é testemunha deste compromisso, está também disposta a ajudar, com o seu exemplo, o crescimento na fé cristã do João?
Todos — Sim, estamos.
7.2 - Sinal da cruz na fronte do João
7.3 - Bênção da água
7.4 - Renúncia ao pecado
Hoje, apenas hoje,
Procurarei viver pensando apenas neste dia
Sem querer resolver de uma só vez
Todos os problemas da minha vida
Hoje, apenas, hoje
Terei o máximo cuidado na minha convivência
Serei cordial, não criticarei nem pretenderei melhorar ou corrigir
Ninguém à força, senão a mim mesmo(a).
Hoje, apenas hoje,
Adaptar-me-ei às circunstâncias
Sem esperar que sejam as circunstâncias
A adaptar-se aos meus desejos
7.5 - Profissão da Fé cristã
Pe. Samelo — Acreditais em Deus:
Um Deus MUITO GRANDE;
Um DEUS BOM, que nos trata como filhos;
Que criou tudo o que conhecemos:
(a terra, o mar, o céu, o arco-íris, as plantas e os animais)
e criou até o que não conhecemos?
Todos — Sim, acredito.
Pe. Samelo — Acreditais em Jesus Cristo:
Filho desse Deus e Deus como o Pai,
Que veio à Terra e nasceu de Maria,
Criança e pessoa como nós,
E que mostrou às pessoas do seu tempo,
O caminho da verdadeira felicidade;
Que foi perseguido e morto pelos poderosos do seu tempo,
E que foi ressuscitado deixando-nos o testemunho dos que O conheceram?
Todos — Sim, acredito.
Pe. Samelo — Acreditais no Espírito Santo:
Fonte maravilhosa de toda a vida,
Igual ao Pai e ao Filho em dignidade,
E que com a Sua força ilumina a fala dos profetas.
Todos — Sim, acredito.
Pe. Samelo — Acreditais na Igreja:
Formada por todos nós,
E por isso mesmo diversa e nunca acabada,
Que dá a conhecer
A grandeza de Deus,
A humanidade de Jesus Cristo que foi morto e ressuscitado,
A beleza do Espírito Santo,
E que nos acolhe no Baptismo que perdoa os pecados?
Todos — Sim, acredito.
Pe. Samelo — Acreditais que seguindo o caminho da felicidade que Jesus Cristo nos propõe, também nós havemos de ressuscitar como Ele para a vida plena?
Todos — Sim, acredito.
Pe. Samelo — Esta é a nossa Fé, esta é a Fé da Igreja que professamos em Jesus Cristo, Nosso Senhor.
Todos — Amén.
7.6 Rito baptismal do João
7.7 Cântico — MEU DESEJO É CANTAR
Não sei que paira hoje no ar
Que me faz sorrir que faz cantar
Não sei que tem meu coração
Que me faz dançar como uma canção.
Meu desejo é cantar as grandezas de Deus
Meu desejo é cantar os céus
Meu desejo é viver em paz e amor
E cantar teu poder Senhor
Uma estrela uma luz como o sol brilha em mim
Meu desejo é sorrir sem fim
Do nascer ao sol pôr todo o tempo é canção
Pois quiseste tomar-me p’la mão.
Só de ti vem minha alegria
E é o teu amor que ilumina o dia
Senhor escuta o meu cantar
Pois já só assim é que sei rezar.
Eu quisera ser livre como a ave do céu
Eu quisera Senhor ser teu
Mas levado por ti eu bem alto direi
Que o amor é a nossa lei
Pois não somos senão uma chispa de luz
Do amor que te pôs na cruz
Quando a morte vier cantar bem alto
Que o Senhor nosso Deus nos conduz.
7.8 Unção depois do baptismo
7.9 Imposição da veste branca
8 - Partilha da palavra e ofertório
9 - Oração Eucarística
P. O Senhor esteja convosco
T. Ele está no meio de nós
P. Corações ao alto
T. O nosso coração está em Deus.
P. Demos graças ao Senhor nosso Deus
T. É nosso dever é nossa salvação
P. É nossa salvação louvar-Te, Deus Pai, por isso Te aclamamos
SANTO!
P. Deus Pai, envia o Teu Espírito sobre este pão e este vinho. Com efeito, eu recebi do Senhor o que também vos transmiti: Na noite em que foi entregue, o Senhor Jesus tomou o pão, e depois de dar graças, partiu-o e disse: “Este é o Meu corpo que é entregue por vós; fazei isto em memória de Mim.”
Do mesmo modo, depois da ceia, tomou o cálice e disse: “Este cálice é a Nova Aliança no Meu sangue: Todas as vezes que dele beberdes, fazei-o em memória de Mim”.
P. Mistério da Fé!
T. Todas as vezes que comemos deste pão e bebemos deste cálice, Anunciamos a morte do Senhor, até que Ele venha!
P. Deus Pai, que o Teu Filho nos faça viver em unidade, com o Papa Bento XVI e o nosso Bispo Albino, e seguindo o mesmo caminho de Maria, a Mãe do Teu Filho e nossa Mãe, e dos Apóstolos e Mártires, lembrando os nossos irmão que adormeceram na esperança da Ressurreição,
T. Queremos seguir o estilo de vida de Jesus.
O mesmo Espírito faça com que “os cristãos não se distingam das outras pessoas nem pela pátria, nem pela língua; Em tudo participem como os outros cidadãos; Toda a terra estrangeira seja a sua pátria e toda a pátria lhes seja estrangeira; Obedeçam às leis estabelecidas, mas pelo seu modo de vida superem as leis; Sejam pobres e enriqueçam os outros: tudo lhes falte e tudo lhes sobre; amem aqueles que os odeiam.”
(Carta a Diogneto V, 1.5.10.13; VI, 6 - Carta do século II-III)
P. Por Cristo, com Cristo, em CristoT. Amén
10 - Entrega da vela acesa (testemunhas de Fé em Cristo Jesus, Luz da Vida)
11 - Pai Nosso
12 - “Éphatha" (= “Abre-te”) (futura profissão pessoal da Fé cristã)
13 - Abraço da Paz — Cântico
São dias que passam
São horas que vão
São lábios que cantam
São mãos que se dão
E deixam saudades
De não ser assim
Toda a vida a vida de agora.
Tudo quanto penso
Tudo quanto sou
É grande é imenso
É tudo o que dou
E ao dá-lo recebo
E fico maior
Do que sou quando me nego.
Criança era outro
Cresci esqueci
A aposta da vida
Ganhei e perdi
O risco me trouxe
Até ao que sou
Nunca basta a vida que foi.
14 - Cântico da Comunhão — VOLTAREI A CANTAR
Refrão
Eu voltarei a cantar
O amor e a esperança
Eu voltarei a cantar
Os caminhos para a paz.
Quando os frios chegarem
As flores morrerão
Mas com a Primavera
De novo renascerão
Talvez me vejas chorar
Quando um amigo parte
A morte leva-me os meus
Mas eu sei que voltarão.
(Refrão)
Talvez me vejas morrer
Talvez me vejas partir
Não chores se és meu amigo
Voltar-me-ás a encontrar
Não sei onde nem quando
Mas será num lugar
Onde não haja grades
E onde possa cantar.
(Refrão)
15 - Cântico de Acção de graças — AVÉ MARIA
Todo o dia dia espero
Que esta hora chegue enfim
Para sentir que o teu olhar
Descansa agora em mim.
Refrão
Avé Maria
Gratia plena
Dominus tecum
Benedicta tu.
Venho confiar-te
O que penso e o que sou
Reza por mim mãe de Jesus
Contigo agora eu vou.
16 - Cântico final — Aquarela (Toquinho/Vinicius de Moraes/G.Morra/M.Fabrizio)
Numa folha qualquer
Eu desenho um sol amarelo
E com cinco ou seis rectas
É fácil fazer um castelo...
Corro o lápis em torno
Da mão e me dou uma luva
E se faço chover
Com dois riscos
Tenho um guarda-chuva...
Se um pinguinho de tinta
Cai num pedacinho
Azul do papel
Num instante imagino
Uma linda gaivota
A voar no céu...
Vai voando
Contornando a imensa
Curva Norte e Sul
Vou com ela
Viajando Havaí
Pequim ou Istambul
Pinto um barco a vela
Branco navegando
É tanto céu e mar
Num beijo azul...
Entre as nuvens
Vem surgindo um lindo
Avião rosa e grená
Tudo em volta colorindo
Com suas luzes a piscar...
Basta imaginar e ele está
Partindo, sereno e lindo
Se a gente quiser
Ele vai pousar...
Numa folha qualquer
Eu desenho um navio
De partida
Com alguns bons amigos
Bebendo de bem com a vida...
De uma América a outra
Eu consigo passar num segundo
Giro um simples compasso
E num círculo eu faço o mundo...
Um menino caminha
E caminhando chega no muro
E ali logo em frente
A esperar pela gente
O futuro está...
E o futuro é uma astronave
Que tentamos pilotar
Não tem tempo, nem piedade
Nem tem hora de chegar
Sem pedir licença
Muda a nossa vida
E depois convida
A rir ou chorar...
Nessa estrada não nos cabe
Conhecer ou ver o que virá
O fim dela ninguém sabe
Bem ao certo onde vai dar
Vamos todos
Numa linda passarela
De uma aquarela
Que um dia enfim
Descolorirá...
Numa folha qualquer
Eu desenho um sol amarelo
(Que descolorirá!)
E com cinco ou seis rectas
É fácil fazer um castelo
(Que descolorirá!)
Giro um simples compasso
Num círculo eu faço
O mundo
(Que descolorirá!)...
Júlio Pereira - Porque sim
domingo, novembro 23
Domingo 34º do Tempo Comum — Domingo de Cristo-Rei
Para esta Celebração o Samelo trouxe-nos duas notícias da Agência Ecclesia sobre os 75 anos da Acção Católica Portuguesa.
"Há 75 anos nascia a Acção Católica Portuguesa
Paulo Fontes afirma que «celebrar os 75 anos da fundação da ACP não poderá ser feito com o olhar virado apenas para o passado»
Há 75 anos, uma carta do papa Pio XI ao cardeal-patriarca de Lisboa D. Manuel Gonçalves Cerejeira, datada de 10 de Novembro de 1933, assinalava oficialmente o lançamento da Acção Católica Portuguesa (ACP), nova organização do apostolado católico no país. A promulgação das suas Bases Orgânicas pelo episcopado português, a 16 de Novembro do mesmo ano, traduzia o início do processo de institucionalização da ACP como organização nacional, visando integrar todos os sectores do apostolado e cobrindo todas as dioceses do país, de modo a totalizar uma nova forma de presença da Igreja Católica na sociedade, marcada pela visão de um catolicismo militante, em prol do que então se designava pela “reconquista cristã” ou “recristianização cristã” da sociedade. A sua criação resultou de factores internos e externos que favoreceram o seu aparecimento e moldaram a sua identidade no quadro de recomposição do catolicismo nacional e de reestruturação da própria Igreja em Portugal, cujo marco mais significativo fora a realização do Concílio Plenário Português, em 1926.
Desde finais do século XIX que, ao sentimento de fragilidade vivido pelo catolicismo no seio de uma sociedade em processo de secularização, correspondera uma vontade de revitalização e um ímpeto associativo dos católicos, de que a Acção Católica Portuguesa foi, de certo modo, herdeira. A estratégia definida pelo episcopado português em 1926 ia no sentido do reforço da chamada “união católica”, da secundarização de tudo o que dividia os católicos, incluindo a política, e de afirmação da autonomia e capacidade de acção da Igreja na sociedade, sob a direcção dos bispos, enquanto expressão da autoridade católica na sociedade. A “participação dos fiéis leigos no apostolado hierárquico da Igreja” marca o entendimento eclesiológico dos anos 30 e parte dos anos 40. O ideal histórico de uma “nova cristandade” teorizado por Jacques Maritain, afirmando o primado do espiritual, constituía o horizonte de mobilização para os que integravam o que então se designava por “exército de Cristo-Rei”. A teologia de Cristo-Rei foi, aliás, um dos principais pólos de referência doutrinal até, pelo menos, ao final dos anos 50 do século XX; e a ACP fez sua a Festa de Cristo-Rei, instituída em 1925. A ideia de que havia que aliar o “combate interior” de cada um ao “combate exterior” na sociedade era o quadro de compreensão de um apostolado que se pretendia simultaneamente religioso e social. A “questão social”, isto é o conflito capital-trabalho e a “imerecida miséria” em que viviam os novos sectores sociais urbanos, em particular o operariado industrial, estimulavam a procura de nova respostas sociais, para que a doutrina social da Igreja e a então chamada “sociologia cristã” procuravam contribuir, oferecendo referências para a acção social e a participação cívica dos católicos.
A natureza específica da nova Acção Católica assentava, desde o início, na ideia do apostolado organizado, realizado por leigos sob mandato da Hierarquia. Foi necessário esperar pelos seus desenvolvimentos e dificuldades, assim como pelas novas dinâmicas do pós-II Guerra Mundial, a par da reflexão teológica desenvolvida por Yves Congar e outros, para se afirmar a especificidade e autonomia do apostolado dos leigos, que a realização do I e II Congressos Mundiais do Apostolado dos Leigos bem exprimiu (1951 e 1957). No caso português, combinou-se a ideia de um apostolado total, capaz de responder e integrar todos os sectores da sociedade, com uma organização duplamente especializada: segundo o sexo e a idade, dando origem a quatro Organizações (Liga dos Homens da Acção Católica, Liga das Mulheres da Acção Católica, Juventude Católica e Juventude Católica Feminina); e de acordo com os chamados “meios sociais” - agrário, escolar, independente, operário e universitário -, dando origem a 20 Organismos Especilizados. Paralelamente, a hierarquização interna e a centralização em cada um dos três planos em que a organização se estruturava (local ou paroquial, diocesano e nacional) procurava assegurar eficácia a um movimento que visava, simultaneamente, a formação de um “escol” (os militantes e dirigentes) e a influência na “massa”.
Os desenvolvimentos do trabalho de formação e reflexão teológicas, a preocupação com o enraizamento social do trabalho de cristianização, a par da activa participação nas dinâmicas internacionais ou supranacionais do catolicismo, foram factores que contribuíram decisivamente para conferir ao movimento católico português alguns novos traços nos anos 50 a 70, em especial: a formação humana, cívica e religiosa de várias gerações de católicos, conforme a uma espiritualidade mais incarnada e cristocêntrica, pese embora o peso do marianismo nas devoções dos movimentos de Acção Católica; o desenvolvimento de um catolicismo social reformista, partindo do estudo e procura de soluções para a realidade nacional, bloqueada pela persistência política do Estado autoritário após a II Guerra Mundial; o aparecimento de novas elites católicas nos mais diversos sectores da sociedade, em particular universitário, intelectual e cultural, mas também operário e de novos sectores profissionais, a par da emergência de novas lideranças e dinâmicas sociais, a nível da juventude, das mulheres, das famílias e do movimento sindical e patronal, entre outros.
Nos anos 70, o esgotamento do paradigma de movimento católico que a ACP corporizou explica o seu desmembramento como corpo orgânico em 1974, sendo que a realização do II Concílio do Vaticano constituiu um importante ponto de viragem neste processo. Muitas das perspectivas teológicas e pastorais que o Concílio viera reconhecer e proclamar tiveram na vida e trabalho da Acção Católica, em todo o mundo, um pioneirismo e um alicerce que, no longo prazo, explicam a sua secundarização, mormente o reconhecimento do valor pleno do apostolado dos leigos, sem necessidade de recurso ao mandato episcopal ou o valor da liberdade religiosa e do pluralismo eclesial e social. No caso português, o paralelismo cronológico verificado entre a vigência do Estado Novo e a existência da ACP (1933-1974) não deve ser interpretado num registo causal, mas deve procurar-se no húmus cultural e sociológico da realidade portuguesa, que aqui não podemos analisar.
O desmembramento da ACP como corpo orgânico não significou o fim daquela experiência. Ao invés, nalguns casos, traduziu-se no relançamento de parte dos movimentos que entretanto se tinham autonomizado no seu interior, alguns dos quais continuam o seu trabalho nos dias de hoje, embora em contexto e em modalidades bem diversos dos iniciais. De igual modo, muitas das intuições sociais, teológicas e pastorais nascidas no seio da Acção Católica fizeram o seu caminho, encontrando noutras dinâmicas sociais e movimentos eclesiais a sua forma de expressão, nomeadamente: o “apostolado do semelhante pelo semelhante”, preconizado pelo papa Pio XI; o método da “revisão de vida”, aprendido na escola da JOC (Juventude Operária Católica) de Joseph Cardjin, seu fundador e figura emblemática do movimento católico internacional; a afirmação do “apostolado de leigos”, apoiado na presença e acompanhamento dos “assistentes eclesiásticos”, função para que se recrutaram e formaram dezenas de padres em todo o país e a partir donde se projectaram figuras marcantes do catolicismo social; a distinção entre “missão interna” e “missão externa”, conforme a uma visão que muito contribuiu para a reflexão missiológica e a reformulação da própria noção de missão; e, por último, a ideia de “militância católica” que, sendo-lhe anterior, aqui encontrou um lugar privilegiado de expressão ao longo do século XX.
Para todos os que se interessam pela memória e história da ACP, celebrar os 75 anos da fundação da ACP não poderá ser feito com o olhar virado apenas para o passado, mas sobretudo para o presente, numa atitude de abertura ao futuro, na procura dos “caminhos não andados” que, também hoje, necessitam ser descobertos e trilhados, na dupla fidelidade à realidade vivida e à pessoa de Jesus Cristo.
Paulo Fontes, Centro de Estudos de História Religiosa - UCP, autor da tese de doutoramento "Elites Católicas na Sociedade e na Igreja em Portugal: o papel da Acção Católica Portuguesa (1940-1961)", defendida em 2006."
"O que resta da Acção Católica Portuguesa?
Historiador Paulo Fontes fala dos 75 anos de fundação e do fim deste corpo global do laicado católico no nosso país
Em Novembro de 1933, na Conferência Plenária do Episcopado português foram aprovadas as bases orgânicas da Acção Católica (AC), que assim nascia no nosso país. Era então definida como “o conjunto das organizações do laicado católico português que propõe a difusão e a defesa dos princípios católicos na vida individual, familiar e social, sob a directa e inteira dependência da hierarquia e por mandato desta recebido”.
A primeira obra de cariz científico sobre a Acção Católica Portuguesa (ACP), apresentada no nosso país teve a autoria de Paulo Fontes, membro do Centro de História Religiosa (CEHR) da Universidade Católica Portuguesa. O historiador considera que a ACP há muito chegou ao fim, no nosso país.
“Hoje quando falamos da celebração dos 75 anos (da AC, ndr), falamos da fundação, porque já não há Acção Católica Portuguesa, há que dizê-lo com clareza”, afirma.
Paulo Fontes assinala que “a ACP como corpo global, orgânico, acabou em 1974”. Nesse ano, a então Comissão Executiva entrega aos Bispos a responsabilidade de acompanharem uma multiplicidade de movimentos autónomos.
Em declarações ao Programa ECCLESIA, este especialista - autor da dissertação de Doutoramento com o título "Elites Católicas na Sociedade e na Igreja em Portugal: o papel da Acção Católica Portuguesa (1940-1961)" – explica que a ACP nasceu “de uma preocupação grande da hierarquia católica, a de encontrar uma resposta orgânica, capaz de envolver os católicos do país, numa cruzada de reconquista cristã ou recristianização da sociedade”.
Procurando um novo modo de estar da Igreja em sociedade, tentou-se secundarizar o que separava os católicos, “nomeadamente a questão política” e “estar presente na sociedade para essa tarefa de recristianização”.
Estando perante um dos fenómenos que mais marcou a vida da Igreja Católica em Portugal, no século passado - apenas suplantado, em importância, por Fátima -, Paulo Fontes destaca o seu efeito “mobilizador”, seja na criação de novas elites, seja nas “massas”.
Uma ideia de “acção católica” já se encontrava no século XIX, dada a necessidade de “reencontrar um espaço onde a presença cristã se fizesse sentir” em sociedades que já não se definiam como religiosas.
A Acção Católica pode ser definida, de forma genérica, como a forma organizada de apostolado dos leigos que, no seguimento dos movimentos católicos do séc. XIX, foi incrementada por Pio XI, alcançando grande implantação sobretudo nos países católicos latinos.
Em Portugal, a Acção Católica incluía duas dezenas de "organismos" especializados por sexos, idades e meios sociais, coordenados por quatro "organizações" e por uma "Junta Central", chegando a contar 100 mil associados na década de 50, segundo dados publicados e cartografados pelo então Pe. Manuel Falcão, hoje Bispo emérito de Beja.
Paulo Fontes destaca a ideia da “evangelização do semelhante pelo semelhante”, que levou a “uma cristianização feita a partir da assunção da condição e do protagonismo dos próprios leigos”, para chegar “onde a hierarquia não chegava”.
Daqui surgiram “experiências novas e diversificadas, umas que tiveram o seu tempo e que terminaram, outras que se transformaram”.
Na sua obra, Paulo Fontes apontava dois elementos que esmoreceram e ajudam a explicar o fim do modelo orgânico da ACP: o primeiro, "um certo entendimento da unidade, porque a Acção Católica procurava afirmar a unidade na diversidade, mas uma unidade entendida como união, que se sobrepunha ao que era a particularidade das dioceses ou as particularidades dos meios sociais".
O segundo elemento é a ideia do "mandato", numa visão de Igreja em que "o protagonismo e a iniciativa dos leigos, de algum modo, ainda estava secundarizado ao próprio apostolado hierárquico".
À ECCLESIA, Paulo Fontes assegura que da ideia de Acção Católica resta hoje “muita coisa”, a começar pelos “movimentos e dinâmicas que prolongam experiências que nasceram no interior deste movimento orgânico e que se autonomizaram”.
Outra herança é a “vitalidade presente em intuições pastorais da AC e que se transpuseram” para campos eclesiais e da sociedade, com destaque para a questão do “apostolado dos leigos” dentro da Igreja Católica e o “enraizamento social do cristianismo”."
"Há 75 anos nascia a Acção Católica Portuguesa
Paulo Fontes afirma que «celebrar os 75 anos da fundação da ACP não poderá ser feito com o olhar virado apenas para o passado»
Há 75 anos, uma carta do papa Pio XI ao cardeal-patriarca de Lisboa D. Manuel Gonçalves Cerejeira, datada de 10 de Novembro de 1933, assinalava oficialmente o lançamento da Acção Católica Portuguesa (ACP), nova organização do apostolado católico no país. A promulgação das suas Bases Orgânicas pelo episcopado português, a 16 de Novembro do mesmo ano, traduzia o início do processo de institucionalização da ACP como organização nacional, visando integrar todos os sectores do apostolado e cobrindo todas as dioceses do país, de modo a totalizar uma nova forma de presença da Igreja Católica na sociedade, marcada pela visão de um catolicismo militante, em prol do que então se designava pela “reconquista cristã” ou “recristianização cristã” da sociedade. A sua criação resultou de factores internos e externos que favoreceram o seu aparecimento e moldaram a sua identidade no quadro de recomposição do catolicismo nacional e de reestruturação da própria Igreja em Portugal, cujo marco mais significativo fora a realização do Concílio Plenário Português, em 1926.
Desde finais do século XIX que, ao sentimento de fragilidade vivido pelo catolicismo no seio de uma sociedade em processo de secularização, correspondera uma vontade de revitalização e um ímpeto associativo dos católicos, de que a Acção Católica Portuguesa foi, de certo modo, herdeira. A estratégia definida pelo episcopado português em 1926 ia no sentido do reforço da chamada “união católica”, da secundarização de tudo o que dividia os católicos, incluindo a política, e de afirmação da autonomia e capacidade de acção da Igreja na sociedade, sob a direcção dos bispos, enquanto expressão da autoridade católica na sociedade. A “participação dos fiéis leigos no apostolado hierárquico da Igreja” marca o entendimento eclesiológico dos anos 30 e parte dos anos 40. O ideal histórico de uma “nova cristandade” teorizado por Jacques Maritain, afirmando o primado do espiritual, constituía o horizonte de mobilização para os que integravam o que então se designava por “exército de Cristo-Rei”. A teologia de Cristo-Rei foi, aliás, um dos principais pólos de referência doutrinal até, pelo menos, ao final dos anos 50 do século XX; e a ACP fez sua a Festa de Cristo-Rei, instituída em 1925. A ideia de que havia que aliar o “combate interior” de cada um ao “combate exterior” na sociedade era o quadro de compreensão de um apostolado que se pretendia simultaneamente religioso e social. A “questão social”, isto é o conflito capital-trabalho e a “imerecida miséria” em que viviam os novos sectores sociais urbanos, em particular o operariado industrial, estimulavam a procura de nova respostas sociais, para que a doutrina social da Igreja e a então chamada “sociologia cristã” procuravam contribuir, oferecendo referências para a acção social e a participação cívica dos católicos.
A natureza específica da nova Acção Católica assentava, desde o início, na ideia do apostolado organizado, realizado por leigos sob mandato da Hierarquia. Foi necessário esperar pelos seus desenvolvimentos e dificuldades, assim como pelas novas dinâmicas do pós-II Guerra Mundial, a par da reflexão teológica desenvolvida por Yves Congar e outros, para se afirmar a especificidade e autonomia do apostolado dos leigos, que a realização do I e II Congressos Mundiais do Apostolado dos Leigos bem exprimiu (1951 e 1957). No caso português, combinou-se a ideia de um apostolado total, capaz de responder e integrar todos os sectores da sociedade, com uma organização duplamente especializada: segundo o sexo e a idade, dando origem a quatro Organizações (Liga dos Homens da Acção Católica, Liga das Mulheres da Acção Católica, Juventude Católica e Juventude Católica Feminina); e de acordo com os chamados “meios sociais” - agrário, escolar, independente, operário e universitário -, dando origem a 20 Organismos Especilizados. Paralelamente, a hierarquização interna e a centralização em cada um dos três planos em que a organização se estruturava (local ou paroquial, diocesano e nacional) procurava assegurar eficácia a um movimento que visava, simultaneamente, a formação de um “escol” (os militantes e dirigentes) e a influência na “massa”.
Os desenvolvimentos do trabalho de formação e reflexão teológicas, a preocupação com o enraizamento social do trabalho de cristianização, a par da activa participação nas dinâmicas internacionais ou supranacionais do catolicismo, foram factores que contribuíram decisivamente para conferir ao movimento católico português alguns novos traços nos anos 50 a 70, em especial: a formação humana, cívica e religiosa de várias gerações de católicos, conforme a uma espiritualidade mais incarnada e cristocêntrica, pese embora o peso do marianismo nas devoções dos movimentos de Acção Católica; o desenvolvimento de um catolicismo social reformista, partindo do estudo e procura de soluções para a realidade nacional, bloqueada pela persistência política do Estado autoritário após a II Guerra Mundial; o aparecimento de novas elites católicas nos mais diversos sectores da sociedade, em particular universitário, intelectual e cultural, mas também operário e de novos sectores profissionais, a par da emergência de novas lideranças e dinâmicas sociais, a nível da juventude, das mulheres, das famílias e do movimento sindical e patronal, entre outros.
Nos anos 70, o esgotamento do paradigma de movimento católico que a ACP corporizou explica o seu desmembramento como corpo orgânico em 1974, sendo que a realização do II Concílio do Vaticano constituiu um importante ponto de viragem neste processo. Muitas das perspectivas teológicas e pastorais que o Concílio viera reconhecer e proclamar tiveram na vida e trabalho da Acção Católica, em todo o mundo, um pioneirismo e um alicerce que, no longo prazo, explicam a sua secundarização, mormente o reconhecimento do valor pleno do apostolado dos leigos, sem necessidade de recurso ao mandato episcopal ou o valor da liberdade religiosa e do pluralismo eclesial e social. No caso português, o paralelismo cronológico verificado entre a vigência do Estado Novo e a existência da ACP (1933-1974) não deve ser interpretado num registo causal, mas deve procurar-se no húmus cultural e sociológico da realidade portuguesa, que aqui não podemos analisar.
O desmembramento da ACP como corpo orgânico não significou o fim daquela experiência. Ao invés, nalguns casos, traduziu-se no relançamento de parte dos movimentos que entretanto se tinham autonomizado no seu interior, alguns dos quais continuam o seu trabalho nos dias de hoje, embora em contexto e em modalidades bem diversos dos iniciais. De igual modo, muitas das intuições sociais, teológicas e pastorais nascidas no seio da Acção Católica fizeram o seu caminho, encontrando noutras dinâmicas sociais e movimentos eclesiais a sua forma de expressão, nomeadamente: o “apostolado do semelhante pelo semelhante”, preconizado pelo papa Pio XI; o método da “revisão de vida”, aprendido na escola da JOC (Juventude Operária Católica) de Joseph Cardjin, seu fundador e figura emblemática do movimento católico internacional; a afirmação do “apostolado de leigos”, apoiado na presença e acompanhamento dos “assistentes eclesiásticos”, função para que se recrutaram e formaram dezenas de padres em todo o país e a partir donde se projectaram figuras marcantes do catolicismo social; a distinção entre “missão interna” e “missão externa”, conforme a uma visão que muito contribuiu para a reflexão missiológica e a reformulação da própria noção de missão; e, por último, a ideia de “militância católica” que, sendo-lhe anterior, aqui encontrou um lugar privilegiado de expressão ao longo do século XX.
Para todos os que se interessam pela memória e história da ACP, celebrar os 75 anos da fundação da ACP não poderá ser feito com o olhar virado apenas para o passado, mas sobretudo para o presente, numa atitude de abertura ao futuro, na procura dos “caminhos não andados” que, também hoje, necessitam ser descobertos e trilhados, na dupla fidelidade à realidade vivida e à pessoa de Jesus Cristo.
Paulo Fontes, Centro de Estudos de História Religiosa - UCP, autor da tese de doutoramento "Elites Católicas na Sociedade e na Igreja em Portugal: o papel da Acção Católica Portuguesa (1940-1961)", defendida em 2006."
in: http://www.agencia.ecclesia.pt/noticia_all.asp?noticiaid=66160&seccaoid=3&tipoid=236
"O que resta da Acção Católica Portuguesa?
Historiador Paulo Fontes fala dos 75 anos de fundação e do fim deste corpo global do laicado católico no nosso país
Em Novembro de 1933, na Conferência Plenária do Episcopado português foram aprovadas as bases orgânicas da Acção Católica (AC), que assim nascia no nosso país. Era então definida como “o conjunto das organizações do laicado católico português que propõe a difusão e a defesa dos princípios católicos na vida individual, familiar e social, sob a directa e inteira dependência da hierarquia e por mandato desta recebido”.
A primeira obra de cariz científico sobre a Acção Católica Portuguesa (ACP), apresentada no nosso país teve a autoria de Paulo Fontes, membro do Centro de História Religiosa (CEHR) da Universidade Católica Portuguesa. O historiador considera que a ACP há muito chegou ao fim, no nosso país.
“Hoje quando falamos da celebração dos 75 anos (da AC, ndr), falamos da fundação, porque já não há Acção Católica Portuguesa, há que dizê-lo com clareza”, afirma.
Paulo Fontes assinala que “a ACP como corpo global, orgânico, acabou em 1974”. Nesse ano, a então Comissão Executiva entrega aos Bispos a responsabilidade de acompanharem uma multiplicidade de movimentos autónomos.
Em declarações ao Programa ECCLESIA, este especialista - autor da dissertação de Doutoramento com o título "Elites Católicas na Sociedade e na Igreja em Portugal: o papel da Acção Católica Portuguesa (1940-1961)" – explica que a ACP nasceu “de uma preocupação grande da hierarquia católica, a de encontrar uma resposta orgânica, capaz de envolver os católicos do país, numa cruzada de reconquista cristã ou recristianização da sociedade”.
Procurando um novo modo de estar da Igreja em sociedade, tentou-se secundarizar o que separava os católicos, “nomeadamente a questão política” e “estar presente na sociedade para essa tarefa de recristianização”.
Estando perante um dos fenómenos que mais marcou a vida da Igreja Católica em Portugal, no século passado - apenas suplantado, em importância, por Fátima -, Paulo Fontes destaca o seu efeito “mobilizador”, seja na criação de novas elites, seja nas “massas”.
Uma ideia de “acção católica” já se encontrava no século XIX, dada a necessidade de “reencontrar um espaço onde a presença cristã se fizesse sentir” em sociedades que já não se definiam como religiosas.
A Acção Católica pode ser definida, de forma genérica, como a forma organizada de apostolado dos leigos que, no seguimento dos movimentos católicos do séc. XIX, foi incrementada por Pio XI, alcançando grande implantação sobretudo nos países católicos latinos.
Em Portugal, a Acção Católica incluía duas dezenas de "organismos" especializados por sexos, idades e meios sociais, coordenados por quatro "organizações" e por uma "Junta Central", chegando a contar 100 mil associados na década de 50, segundo dados publicados e cartografados pelo então Pe. Manuel Falcão, hoje Bispo emérito de Beja.
Paulo Fontes destaca a ideia da “evangelização do semelhante pelo semelhante”, que levou a “uma cristianização feita a partir da assunção da condição e do protagonismo dos próprios leigos”, para chegar “onde a hierarquia não chegava”.
Daqui surgiram “experiências novas e diversificadas, umas que tiveram o seu tempo e que terminaram, outras que se transformaram”.
Na sua obra, Paulo Fontes apontava dois elementos que esmoreceram e ajudam a explicar o fim do modelo orgânico da ACP: o primeiro, "um certo entendimento da unidade, porque a Acção Católica procurava afirmar a unidade na diversidade, mas uma unidade entendida como união, que se sobrepunha ao que era a particularidade das dioceses ou as particularidades dos meios sociais".
O segundo elemento é a ideia do "mandato", numa visão de Igreja em que "o protagonismo e a iniciativa dos leigos, de algum modo, ainda estava secundarizado ao próprio apostolado hierárquico".
À ECCLESIA, Paulo Fontes assegura que da ideia de Acção Católica resta hoje “muita coisa”, a começar pelos “movimentos e dinâmicas que prolongam experiências que nasceram no interior deste movimento orgânico e que se autonomizaram”.
Outra herança é a “vitalidade presente em intuições pastorais da AC e que se transpuseram” para campos eclesiais e da sociedade, com destaque para a questão do “apostolado dos leigos” dentro da Igreja Católica e o “enraizamento social do cristianismo”."
Octávio Carmo | 19/11/2008 | História da Igreja
in: http://www.agencia.ecclesia.pt/noticia_all.asp?noticiaid=66507&seccaoid=3&tipoid=186
in: http://www.agencia.ecclesia.pt/noticia_all.asp?noticiaid=66507&seccaoid=3&tipoid=186
domingo, novembro 16
Domingo 33º do Tempo Comum
Para o momento da partilha, a Clara Lourenço e o Raimundo propuseram-nos estas reflexões:
“Quem poderá encontrar uma mulher virtuosa?”
Esta pergunta com que se inicia a primeira leitura do 33º Domingo do tempo comum, retirada do Livro dos Provérbios e frequentemente apresentada como “um poema em louvor da mulher virtuosa”, não pode deixar de nos interpelar e de modo muito particular quando somos mulheres. Com efeito, o carácter interrogativo bem como o uso do determinante indefinido não deixam dúvidas quanto à ideologia de quem coloca a questão, ideologia que a frase seguinte de imediato esclarece. “O seu valor é maior que o das pérolas”. Colocando o valor da mulher virtuosa acima do valor atribuído às pérolas, coisa rara e valiosa por excelência, afirma-se a dificuldade de encontrar alguma mulher que corresponda por inteiro ao que se procura. Logo aqui vemos que, na verdade e contrariamente à ideia de louvor da mulher virtuosa, o que sobressai é a sua raridade e quiçá a possibilidade da sua existência. Mas o texto, que continua fazendo a exaltação das prendas da mulher virtuosa e do modo como ela as coloca ao serviço do bem-estar do marido e dos outros, num gesto de entrega e doação abnegada de si, oferece ainda outros elementos dignos de reflexão. A mulher virtuosa é aquela que zela pelo bem-estar do marido, poupando-o a preocupações, entregando-se ao trabalho de modo a assegurar-lhe tranquilidade e alegria sem se deixar dominar por desejos enganadores e supérfluos. E é também aquela que teme o Senhor estabelecendo-se assim uma assimilação entre os deveres de esposa e os deveres para com o Senhor.
Mas não podemos esquecer que se trata de um texto extraído do Livro dos Provérbios que tem uma função socializadora baseada na sabedoria popular e como tal compreensível no contexto em que foi escrito. Aquilo que já não compreendemos tão facilmente é a forma como este e outros textos sagrados foram utilizados para, ao longo dos tempos e ainda hoje, perpetuar uma ideologia claramente redutora da dignidade da mulher subordinando essa dignidade a uma dimensão funcional de esposa e mãe em vez de relacioná-la com a mulher enquanto ser humano de pleno direito e igual dignidade aos olhos de Deus.
Uma última nota sobre a ideia que subjaz na seguinte afirmação: “a mulher que teme o Senhor é que será louvada.” Onde está a virtude de quem age por temor e não por amor?
Quem é o nosso Deus? Um Deus castigador, vingador, ou um Deus amoroso que a todos acolhe e perdoa?
“Ditoso o que segue o caminho do Senhor.”
Com todo o meu ser
Há muito tempo – não sei precisar desde quando – que fico algo irritado ou, melhor, desconfortável, com a inevitável abordagem da leitura deste Evangelho em que se reforça a importância de pormos a render os “talentos” que nos calharam nesta vida terrena, por fortuna ou azar, de origem mais material ou de inspiração mais divina.
Não gosto particularmente das expressões que Cristo (ou o Evangelista, ou o tradutor) colocam na boca do Senhor/Patrão dos servos quando decide castigar o que nada fez. Não posso deixar de recordar as minhas aulas de “Políticas e técnicas de financiamento da construção” no já longínquo ano de 87, em que nasceu a Luísa e em que comecei o Mestrado no Porto. Nessa cadeira, então tutelada por Miguel Cadilhe – que nunca nos deu a honra da sua presença – aprendia-se que o juro é como tempo: não pára. Um dia em que não se contabiliza a sua valorização é porque estamos perder. Em cada minuto, o dinheiro no meu bolso, parado, não investido, sem produzir algo, está a desvalorizar.
Esta dependência da evolução e do crescimento constante é, no mínimo, assustadora, quando se compara com o recorde de uma marca desportiva que se pode sempre teoricamente superar. Só há um limite: o nadador ou o maratonista não podem chegar antes de partir. Quando se esquece essa regra básica, tudo pode acontecer… no desporto, na banca, no mundo, na nossa vida.
Explicado o motivo do desconforto com a parte final do Evangelho e confessada esta angústia resultante do insuficiente conhecimento dos mecanismos da economia, posso dar-vos o meu testemunho.
Assumo que os talentos devem ser postos a render e não vou perder tempo a discutir quais são e porquê.
Pergunto antes, para quê? Com que objectivo? Servindo os interesses de qual Senhor?
Na Bíblia a resposta é simples porque, dizendo tudo, corre o risco de não dizer nada. O grande sentido, o grande objectivo será: “amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a nós mesmos”. Pois é…! E como é que isso se faz com cada um dos nossos (dos meus talentos)? Onde está o preto e o branco, o certo e o errado, num mundo em que a ciência cada vez mais instala a verdade da dúvida?
O poder não autoritário – a qualquer nível – é um talento que deve ser posto a render o mais possível, não a favor de quem o tem, mas de quem lho entrega, de quem lhe dá razão de ser. Se assim fosse, “poder” era “serviço” e talvez estivesse mais próximo da lógica do Evangelho, independentemente da convicção religiosa de cada um.
Na vida profissional sou engenheiro, sou professor, sou investigador e sou gestor. Tento colocar “todo o meu ser” (expressão que gosto muito) naquilo faço, acreditando que, assim, valorizo os tais talentos que me calharam. Como posso saber se o faço bem, se todos os dias sou confrontado com alegadas contradições e ineficácias? Acredito que esta dúvida é, no mínimo, uma indicação ténue de um bom caminho. Sublinho “um” bom caminho porque insisto em acreditar há vários possíveis e que, provavelmente, o Senhor/Patrão dos servos, se parasse um pouco mais e não respondesse ao imperativo de dar, ali e naquele instante, uma mensagem directa e inequívoca, teria encontrado as boas razões do último servo, apesar de diferentes das suas. Que mais valia terá ele angariado que o Senhor/Patrão não conseguiu vislumbrar?
Não acredito no juro fácil, não acredito na verdade única, não acredito na certeza inabalável. Acredito numa inquietação produtiva, reflectida em comunidade, tantas vezes demasiado cansativa, mas que só tem sentido se o juro dos talentos tiver um destinatário maior do que o meu umbigo, mesmo que ele seja do tamanho do mundo.
Comunidade João XXIII – 16.NOV.08
“Quem poderá encontrar uma mulher virtuosa?”
Esta pergunta com que se inicia a primeira leitura do 33º Domingo do tempo comum, retirada do Livro dos Provérbios e frequentemente apresentada como “um poema em louvor da mulher virtuosa”, não pode deixar de nos interpelar e de modo muito particular quando somos mulheres. Com efeito, o carácter interrogativo bem como o uso do determinante indefinido não deixam dúvidas quanto à ideologia de quem coloca a questão, ideologia que a frase seguinte de imediato esclarece. “O seu valor é maior que o das pérolas”. Colocando o valor da mulher virtuosa acima do valor atribuído às pérolas, coisa rara e valiosa por excelência, afirma-se a dificuldade de encontrar alguma mulher que corresponda por inteiro ao que se procura. Logo aqui vemos que, na verdade e contrariamente à ideia de louvor da mulher virtuosa, o que sobressai é a sua raridade e quiçá a possibilidade da sua existência. Mas o texto, que continua fazendo a exaltação das prendas da mulher virtuosa e do modo como ela as coloca ao serviço do bem-estar do marido e dos outros, num gesto de entrega e doação abnegada de si, oferece ainda outros elementos dignos de reflexão. A mulher virtuosa é aquela que zela pelo bem-estar do marido, poupando-o a preocupações, entregando-se ao trabalho de modo a assegurar-lhe tranquilidade e alegria sem se deixar dominar por desejos enganadores e supérfluos. E é também aquela que teme o Senhor estabelecendo-se assim uma assimilação entre os deveres de esposa e os deveres para com o Senhor.
Mas não podemos esquecer que se trata de um texto extraído do Livro dos Provérbios que tem uma função socializadora baseada na sabedoria popular e como tal compreensível no contexto em que foi escrito. Aquilo que já não compreendemos tão facilmente é a forma como este e outros textos sagrados foram utilizados para, ao longo dos tempos e ainda hoje, perpetuar uma ideologia claramente redutora da dignidade da mulher subordinando essa dignidade a uma dimensão funcional de esposa e mãe em vez de relacioná-la com a mulher enquanto ser humano de pleno direito e igual dignidade aos olhos de Deus.
Uma última nota sobre a ideia que subjaz na seguinte afirmação: “a mulher que teme o Senhor é que será louvada.” Onde está a virtude de quem age por temor e não por amor?
Quem é o nosso Deus? Um Deus castigador, vingador, ou um Deus amoroso que a todos acolhe e perdoa?
“Ditoso o que segue o caminho do Senhor.”
Clara Moura Lourenço
Com todo o meu ser
Há muito tempo – não sei precisar desde quando – que fico algo irritado ou, melhor, desconfortável, com a inevitável abordagem da leitura deste Evangelho em que se reforça a importância de pormos a render os “talentos” que nos calharam nesta vida terrena, por fortuna ou azar, de origem mais material ou de inspiração mais divina.
Não gosto particularmente das expressões que Cristo (ou o Evangelista, ou o tradutor) colocam na boca do Senhor/Patrão dos servos quando decide castigar o que nada fez. Não posso deixar de recordar as minhas aulas de “Políticas e técnicas de financiamento da construção” no já longínquo ano de 87, em que nasceu a Luísa e em que comecei o Mestrado no Porto. Nessa cadeira, então tutelada por Miguel Cadilhe – que nunca nos deu a honra da sua presença – aprendia-se que o juro é como tempo: não pára. Um dia em que não se contabiliza a sua valorização é porque estamos perder. Em cada minuto, o dinheiro no meu bolso, parado, não investido, sem produzir algo, está a desvalorizar.
Esta dependência da evolução e do crescimento constante é, no mínimo, assustadora, quando se compara com o recorde de uma marca desportiva que se pode sempre teoricamente superar. Só há um limite: o nadador ou o maratonista não podem chegar antes de partir. Quando se esquece essa regra básica, tudo pode acontecer… no desporto, na banca, no mundo, na nossa vida.
Explicado o motivo do desconforto com a parte final do Evangelho e confessada esta angústia resultante do insuficiente conhecimento dos mecanismos da economia, posso dar-vos o meu testemunho.
Assumo que os talentos devem ser postos a render e não vou perder tempo a discutir quais são e porquê.
Pergunto antes, para quê? Com que objectivo? Servindo os interesses de qual Senhor?
Na Bíblia a resposta é simples porque, dizendo tudo, corre o risco de não dizer nada. O grande sentido, o grande objectivo será: “amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a nós mesmos”. Pois é…! E como é que isso se faz com cada um dos nossos (dos meus talentos)? Onde está o preto e o branco, o certo e o errado, num mundo em que a ciência cada vez mais instala a verdade da dúvida?
O poder não autoritário – a qualquer nível – é um talento que deve ser posto a render o mais possível, não a favor de quem o tem, mas de quem lho entrega, de quem lhe dá razão de ser. Se assim fosse, “poder” era “serviço” e talvez estivesse mais próximo da lógica do Evangelho, independentemente da convicção religiosa de cada um.
Na vida profissional sou engenheiro, sou professor, sou investigador e sou gestor. Tento colocar “todo o meu ser” (expressão que gosto muito) naquilo faço, acreditando que, assim, valorizo os tais talentos que me calharam. Como posso saber se o faço bem, se todos os dias sou confrontado com alegadas contradições e ineficácias? Acredito que esta dúvida é, no mínimo, uma indicação ténue de um bom caminho. Sublinho “um” bom caminho porque insisto em acreditar há vários possíveis e que, provavelmente, o Senhor/Patrão dos servos, se parasse um pouco mais e não respondesse ao imperativo de dar, ali e naquele instante, uma mensagem directa e inequívoca, teria encontrado as boas razões do último servo, apesar de diferentes das suas. Que mais valia terá ele angariado que o Senhor/Patrão não conseguiu vislumbrar?
Não acredito no juro fácil, não acredito na verdade única, não acredito na certeza inabalável. Acredito numa inquietação produtiva, reflectida em comunidade, tantas vezes demasiado cansativa, mas que só tem sentido se o juro dos talentos tiver um destinatário maior do que o meu umbigo, mesmo que ele seja do tamanho do mundo.
Comunidade João XXIII – 16.NOV.08
Raimundo Mendes da Silva
domingo, novembro 9
Domingo 32º do Tempo Comum (Dedicação da Basílica de Latrão)
Alterações climáticas pedem actuação ética
Bispos da Comissão das Conferências Episcopais da União Europeia pedem actuação de católicos e políticos
Os bispos da COMECE - Comissão das Conferências Episcopais da União Europeia apelam aos cristãos e às Igrejas que sejam exemplo na mudança de estilo de vida para combater as alterações climáticas.
É este o principal apelo dado a conhecer, esta tarde, na apresentação do documento «Uma visão Cristã das Alterações Climáticas», da responsabilidade do grupo de especialistas constituído pela COMECE e partilhado pelo Comissário da União Europeia.
O documento sublinha que o enorme desafio do clima é “dirigido a toda a humanidade” e lança um apelo a todos os líderes europeus para “basearem as suas políticas num pensamento ético, na justiça inter-geracional e na solidariedade para com os países do Sul”. Os especialistas apelam ainda às Igrejas e aos cristãos para serem exemplo na adopção de um estilo de vida baseado na moderação.
“A luta contra as alterações climáticas deve ser reconhecida, acima de tudo, como um problema público e ético”. Os especialistas entendem que será difícil a sua resolução sem desafiar “determinados organismos sociais, sem questionar formas de vida comum e o sistema de valores da sociedade civil”.
De forma a convencer os cidadãos que, fundamentalmente, têm de mudar a sua forma de vida e de pensar, “os líderes políticos deveriam desencadear uma profunda reflexão e debate ético”. Segundo o relatório, a reflexão deveria ser baseada na teologia cristã, que “tem vindo a desenvolver interessantes ideias sobre esta matéria”.
“Acima de tudo, os valores e princípios do ensino social da Igreja, justiça global, atenção aos pobres, subsidariedade, solidariedade e responsabilidade para o bem comum, poderia permitir uma avaliação sobre as políticas climáticas”, explicam os especialistas.
Os autores do estudo dão especial ênfase no facto de as alterações climáticas serem uma questão de “justiça intra e inter-geracional”. Consequentemente, os especialistas pedem à UE que assuma a liderança e que faça ouvir a sua voz em benefício dos países em vias de desenvolvimento e das gerações futuras que irão suportar ou já suportam o peso das alterações climáticas.
“A UE tem uma responsabilidade especial no combate às alterações climáticas, devido aos meios tecnológicos, financeiros e devido à experiência na acção cooperativa. A EU deveria ser exemplo e convencer os actores para a necessidade de proteger o clima na Terra”.
O documento aponta ainda que as alterações climáticas são sintoma de “uma forma de vida insustentável, produção e padrões de consumo que envolvem o mundo industrializado mas que não sustentam o futuro”. Os especialistas pedem a todos os cidadãos que questionem a sua forma de vida, demasiado dependente em bens materiais, e que baseiam a sua vida em bens culturais e relacionais.
“O nosso modo de vida deveria ser baseado numa «moderação voluntária», uma virtude central que deveria ser compreendida como um desejo, e não compreendida à luz da ambição”.
Segundo o documento, “a Igreja Católica e todos os cristãos estão melhor posicionados para veicular mudanças nos modos de vida, através de propostas concretas e modestos exemplos”.
Como forma de contribuir para o debate sobre alterações climáticas, a COMECE decidiu, oficialmente, estabelecer um grupo de trabalho sobre «Políticas da UE sobre alterações climáticas e o modo de vida cristão». O grupo, constituído por 10 personalidades europeias dos campos da política e ciência, irá submeter o seu relatório à COMECE por ocasião da Assembleia Plenária, marcada para 12 de Novembro.
DEDICAÇÃO DA BASÍLICA DE LATRÃO
9 de Novembro
O palácio de Latrão, propriedade da família imperial, tornou-se no século IV, habitação particular do papa. A Basílica adjacente, construída pelo imperador Constantino e dedicada, em 320, ao Divino Salvador, foi a primeira catedral do mundo: aí se celebravam os baptismos na noite de Páscoa. Mais tarde dedicada também aos dois santos João, Baptista e Evangelista, foi por muito tempo considerada a Igreja mãe da Diocese de Roma, e nela se realizaram as sessões de cinco grandes Concílios ecuménicos.
A Basílica de S. João de Latrão é a Catedral do Papa como Bispo de Roma - aí preside o Papa à Celebração da Eucaristia em Quinta Feira Santa.
Segundo uma tradição que remonta ao século XII, celebra-se no dia 9 de Novembro o aniversário da Dedicação (ou Consagração) da Basílica de Latrão. Inicialmente foi uma festa exclusivamente da cidade de Roma; mais tarde, estendeu-se à Igreja de rito romano, com o fim de honrar a Basílica que é chamada «a Igreja mãe de todas as Igrejas da Urbe [Cidade (de Roma)] e do Orbe (Mundo)» e como sinal de unidade com o Bispo da Diocese de Roma que, como escreveu Santo Inácio de Antioquia (†107), «preside à assembleia universal da caridade».
Unindo-se no dia 9 de Novembro, à Diocese de Roma, as Dioceses de todo o mundo lhe reconhecem a «presidência da caridade». Analogamente sucede na festa da Dedicação da Igreja Catedral de cada Diocese, à qual estão “ligadas” todas as paróquias e comunidades que dela dependem (na Diocese de Coimbra o aniversário da Dedicação da Igreja Catedral que é a Sé Nova é no dia 16 de Novembro).
Sobre este tema, o Samelo mandou-nos mais duas reflexões, que podem ser vistas aqui e aqui.
Bispos da Comissão das Conferências Episcopais da União Europeia pedem actuação de católicos e políticos
Os bispos da COMECE - Comissão das Conferências Episcopais da União Europeia apelam aos cristãos e às Igrejas que sejam exemplo na mudança de estilo de vida para combater as alterações climáticas.
É este o principal apelo dado a conhecer, esta tarde, na apresentação do documento «Uma visão Cristã das Alterações Climáticas», da responsabilidade do grupo de especialistas constituído pela COMECE e partilhado pelo Comissário da União Europeia.
O documento sublinha que o enorme desafio do clima é “dirigido a toda a humanidade” e lança um apelo a todos os líderes europeus para “basearem as suas políticas num pensamento ético, na justiça inter-geracional e na solidariedade para com os países do Sul”. Os especialistas apelam ainda às Igrejas e aos cristãos para serem exemplo na adopção de um estilo de vida baseado na moderação.
“A luta contra as alterações climáticas deve ser reconhecida, acima de tudo, como um problema público e ético”. Os especialistas entendem que será difícil a sua resolução sem desafiar “determinados organismos sociais, sem questionar formas de vida comum e o sistema de valores da sociedade civil”.
De forma a convencer os cidadãos que, fundamentalmente, têm de mudar a sua forma de vida e de pensar, “os líderes políticos deveriam desencadear uma profunda reflexão e debate ético”. Segundo o relatório, a reflexão deveria ser baseada na teologia cristã, que “tem vindo a desenvolver interessantes ideias sobre esta matéria”.
“Acima de tudo, os valores e princípios do ensino social da Igreja, justiça global, atenção aos pobres, subsidariedade, solidariedade e responsabilidade para o bem comum, poderia permitir uma avaliação sobre as políticas climáticas”, explicam os especialistas.
Os autores do estudo dão especial ênfase no facto de as alterações climáticas serem uma questão de “justiça intra e inter-geracional”. Consequentemente, os especialistas pedem à UE que assuma a liderança e que faça ouvir a sua voz em benefício dos países em vias de desenvolvimento e das gerações futuras que irão suportar ou já suportam o peso das alterações climáticas.
“A UE tem uma responsabilidade especial no combate às alterações climáticas, devido aos meios tecnológicos, financeiros e devido à experiência na acção cooperativa. A EU deveria ser exemplo e convencer os actores para a necessidade de proteger o clima na Terra”.
O documento aponta ainda que as alterações climáticas são sintoma de “uma forma de vida insustentável, produção e padrões de consumo que envolvem o mundo industrializado mas que não sustentam o futuro”. Os especialistas pedem a todos os cidadãos que questionem a sua forma de vida, demasiado dependente em bens materiais, e que baseiam a sua vida em bens culturais e relacionais.
“O nosso modo de vida deveria ser baseado numa «moderação voluntária», uma virtude central que deveria ser compreendida como um desejo, e não compreendida à luz da ambição”.
Segundo o documento, “a Igreja Católica e todos os cristãos estão melhor posicionados para veicular mudanças nos modos de vida, através de propostas concretas e modestos exemplos”.
Como forma de contribuir para o debate sobre alterações climáticas, a COMECE decidiu, oficialmente, estabelecer um grupo de trabalho sobre «Políticas da UE sobre alterações climáticas e o modo de vida cristão». O grupo, constituído por 10 personalidades europeias dos campos da política e ciência, irá submeter o seu relatório à COMECE por ocasião da Assembleia Plenária, marcada para 12 de Novembro.
(in: http://www.agencia.ecclesia.pt/noticia_all.asp?noticiaid=65708&seccaoid=4&tipoid=53)
DEDICAÇÃO DA BASÍLICA DE LATRÃO
9 de Novembro
O palácio de Latrão, propriedade da família imperial, tornou-se no século IV, habitação particular do papa. A Basílica adjacente, construída pelo imperador Constantino e dedicada, em 320, ao Divino Salvador, foi a primeira catedral do mundo: aí se celebravam os baptismos na noite de Páscoa. Mais tarde dedicada também aos dois santos João, Baptista e Evangelista, foi por muito tempo considerada a Igreja mãe da Diocese de Roma, e nela se realizaram as sessões de cinco grandes Concílios ecuménicos.
A Basílica de S. João de Latrão é a Catedral do Papa como Bispo de Roma - aí preside o Papa à Celebração da Eucaristia em Quinta Feira Santa.
Segundo uma tradição que remonta ao século XII, celebra-se no dia 9 de Novembro o aniversário da Dedicação (ou Consagração) da Basílica de Latrão. Inicialmente foi uma festa exclusivamente da cidade de Roma; mais tarde, estendeu-se à Igreja de rito romano, com o fim de honrar a Basílica que é chamada «a Igreja mãe de todas as Igrejas da Urbe [Cidade (de Roma)] e do Orbe (Mundo)» e como sinal de unidade com o Bispo da Diocese de Roma que, como escreveu Santo Inácio de Antioquia (†107), «preside à assembleia universal da caridade».
Unindo-se no dia 9 de Novembro, à Diocese de Roma, as Dioceses de todo o mundo lhe reconhecem a «presidência da caridade». Analogamente sucede na festa da Dedicação da Igreja Catedral de cada Diocese, à qual estão “ligadas” todas as paróquias e comunidades que dela dependem (na Diocese de Coimbra o aniversário da Dedicação da Igreja Catedral que é a Sé Nova é no dia 16 de Novembro).
Sobre este tema, o Samelo mandou-nos mais duas reflexões, que podem ser vistas aqui e aqui.
sexta-feira, novembro 7
"...na eternidade do Deus vivo e infinitamente bom"
A nossa Celebração começou a ser preparada ainda na véspera, no Dia de Todos os Santos, com o José Pureza a chamar-nos a atenção par ao artigo do Anselmo Borges no Diário de Notícias.
No Domingo, juntámo-nos para Celebrar a Vida!
Iniciámos a nossa Eucaristia com um belíssimo momento de evocação dos nossos mortos:
Charlie Haden with Josh Haden & Jerry Douglas - Spiritual
SPIRITUAL
Jesus, I don't want to die alone
Jesus, oh Jesus, I don't want to die alone
My love wasn't true
Now all I have is you
Jesus, oh Jesus, I don't want to die alone.
Jesus, if you hear my last breath
Don't leave me here
Left to die a lonely death
I know I have sinned
But Lord I'm suffering
Jesus, oh Jesus, if you hear
My last breath.
All my troubles
All my pain
Will leave me
Once again
Para o momento do perdão, rezámos com um poema de Angelo Roncalli (Papa João XXIII):
HOJE, APENAS HOJE
Hoje, apenas hoje, procurarei viver pensando
apenas neste dia, sem querer resolver de uma
só vez todos os problemas da minha vida.
Hoje, apenas hoje, terei o máximo cuidado
na minha convivência: serei cordial, não criticarei
nem pretenderei melhorar ou corrigir
ninguém à força, senão a mim mesmo.
Hoje, apenas hoje, adaptar-me-ei às circunstâncias,
sem esperar que sejam todas as
circunstâncias a adaptar-se aos meus desejos.
Foi, assim, um início intenso, rico, pleno de memória: não só pelos nossos familiares e amigos mas, também, pelo 50º aniversário da eleição do Cardeal Angelo Roncalli para Papa: o Bom Papa João XXIII (28 de Outubro).
Por isso mesmo, na Liturgia da Palavra, relemos dois trechos de uma acutilante actualidade:
“O maior problema da época moderna talvez seja o das relações entre as comunidades políticas economicamente desenvolvidas e as que se encontram em fase de desenvolvimento económico; as primeiras, por conseguinte, com alto nível de vida; as outras, em condições de escassez ou de miséria. A solidariedade que une todos os seres humanos e os torna membros de uma só família, impõe aos países que dispõem com abundância de meios de subsistência o dever de não permanecerem indiferentes diante das comunidades políticas cujos membros se debatem com as dificuldades da indigência, da miséria e da fome e não gozam dos direitos elementares da pessoa humana. Tanto mais que, dada a interdependência cada vez maior entre os povos, não é possível que entre eles reine uma paz durável e fecunda, se o desnível das condições económicas for excessivo.” (Mater et Magistra, 1961)
No momento da partilha, escutámos alguns testemunhos, sobre João XXIII, que nos foram trazidos pelo José Pureza; são eles do Zé Dias, da Alfreda Fonseca, do Miguel Marujo e do Anselmo Borges. Aqui ficam:
JOÃO XXIII – O PAPA DA BONDADE, DA CONCÓRDIA E DA ATENÇÃO AO ESPÍRITO SANTO
Nos 50 anos da eleição do Papa João XXIII, recordo especialmente a sua capacidade de ler os sinais dos tempos e neles interpretar os apelos da humanidade em busca de Deus, bem como a resposta que a Fé no Deus de Amor, de Jesus Cristo, pode ser proposta a cada pessoa.
Provavelmente muitos de nós hoje não seriamos crentes se não fosse a coragem deste Papa que convocou o concílio Vaticano II.
A Igreja tinha acumulado tanta “ganga” histórica que se tinha tornado quase “opaca” à mensagem evangélica. As formas ritualistas de piedade cristã, eurocêntricas e datadas com prazo de validade expirado, tornavam-se um obstáculo a que o pensamento e a busca livre dos fiéis fosse admitido. O virar costas à Modernidade, o conservadorismo implícito e explícito tornando anátema tudo aquilo que fosse levemente distinto do centralismo (nada) democrático romano, tinha levado a Igreja e o seu precioso depósito da Fé para um beco sem saída.
A capacidade de João XXIII de saber quando e como abrir a janela e deixar entrar a ventania que foi o sopro forte do Espírito Santo e arejar a instituição reconduzindo-a à sua função inicial de mostrar o rosto de Deus através de Jesus Cristo incarnado na nossa História muito humana e diversa, é a prova que o Reino de Deus está entre nós e que é possível vivê-lo a anunciá-lo.
Era inesperado que este Papa, velho, doente e com uma carreira burocrático - eclesiástica na Santa Sé, pudesse ser em 1º lugar, eleito Papa, e depois, o protagonista da maior mudança a que a Catolicidade foi chamada no sec XX …e no entanto foi através dele que o Espírito de Deus se manifestou a todos nós. Estamos-lhe gratos por isso. Pelo menos eu estou!
Alfreda Fonseca
TÃO PERTO E TÃO LONGE
Não é fácil falar de João XXIII na minha vida. Do Bom Papa, como o chamavam e chamam, não retenho mais do que uma imagem impressionista, em que o real se mistura muitas vezes com o imaginário - aquelas em fotos rugosas de jornais amarelecidos, estas em filmes que nos mostram outra cara e esquecem a complexidade da vida pela simplicidade hagiográfica de contar uma história. O que é real foi a descoberta em fragmentos soltos, frases dispersas, excertos de textos maiores de um pensamento que nos inquietava, do sobressalto que era pensar a Igreja no mundo, sem conjunção nem adversativa porque a Igreja está no mundo, é do mundo, vive aí.
Para mim, João XXIII é pois um Papa de uma história tão longínqua como próxima, feita de atenção às pequenas coisas do mundo. Longe no tempo, próxima na inquietação de querer mudar, palavra chave para este tempo de tanta acomodação e resignação. Nos meus tempos de militante do MCE era também nas suas palavras que muitas vezes tropeçávamos à procura de notas ou apontamentos que nos dessem pistas para o nosso trabalho, mais ainda para ideias que pareciam ir contra a corrente.
Mas contra a corrente continua a ser esses monumentos de palavras que nos obrigam a parar que são Pacem in Terris, que permanece dramaticamente actual, apesar de ter sido escrita por causa da guerra fria, e Mater et Magistra, que devia ser pão para a boca para tantos nesta nossa Igreja. Afinal, recorda-nos o Papa, a abrir o documento, que "a Santa Igreja, apesar de ter, como principal missão, a de santificar as almas e de as fazer participar dos bens da ordem sobrenatural, não deixa de preocupar-se ao mesmo tempo com as exigências da vida quotidiana dos homens, não só naquilo que diz respeito ao sustento e às condições de vida, mas também no que se refere à prosperidade e à civilização em seus múltiplos aspectos, dentro do condicionamento de várias épocas."
Há 50 anos e tão actual. Devo corrigir-me: a história de Angelo Roncalli só me é próxima. De longínqua não tem nada.
Miguel Marujo
1. Impressionou-me a sua simplicidade e imenso humor. Lembro, por exemplo, aquela vez em que, já ele Papa, um aluno de um Colégio Universitário em Roma lhe perguntou como era sentir-se o primeiro no Vaticano. E ele: "Está enganado; eu estive a contá-los e devo ser o sexto ou o sétimo..."
2. Era um cristão, com bondade boa. Assim, também lembro aquela vez em que ele chegou tarde ao Varicano e havia muita gente à espera dele. Dirigiu-lhes umas breves palavras, terminando: "já é tarde; olhai para a lua que esta noite está tão bela; ide para casa e não vos esqueçais de dar um beijo meu aos filhos pequenos."
3. Porque era cristão e já se tinha apercebido de que na Igreja o ar era irrespirável, convocou um Concílio Ecuménico, na tentativa de converter a Igreja ao Evangelho e tornar os católicos cristãos, na fraternidade universal.
4. Se ele fosse vivo e ouvisse falar da vossa Comunidade João XXIII, estou convencido de que ficaria contente e dar-vos-is ânimo para continuardes.
Um abraço amigo
Anselmo
Já no Credo, rezámos esta bela oração de Martin Luther King, tendo (como música de fundo), uma lindíssima interpretação do We Shall Overcome:
Charlie Haden & Hank Jones - We Shall Overcome
"Hoje,
na noite do mundo e na esperança da Boa Nova,
eu afirmo com audácia minha fé no futuro da humanidade.
Recuso crer que as circunstâncias actuais
tornem os homens incapazes de fazer uma terra melhor.
Recuso crer que o ser humano
não seja mais do que um boneco de palha agitado pela corrente da vida,
sem ter a possibilidade de influir minimamente no curso dos acontecimentos.
Recuso-me a partilhar a opinião dos que pretendem
que o homem está de tal maneira prisioneiro da noite sem estrelas,
da guerra e do racismo,
que a aurora luminosa da paz e da fraternidade não possa nunca tornar-se realidade.
Recuso fazer minha a predição cínica
daqueles que dizem que os povos mergulharão, um após outro,
no turbilhão do militarismo, até o inferno da destruição termonuclear.
Eu creio que a verdade e o amor incondicionais
terão efectivamente a última palavra.
A vida, ainda que provisoriamente derrotada,
é sempre mais forte que a morte.
Eu creio firmemente que,
mesmo no meio das bombas que explodem e dos canhões que troam,
permanece a esperança de um amanhã radioso.
Ouso crer que, um dia, todos os habitantes da terra
poderão receber três refeições por dia para a vida de seu corpo,
a educação e a cultura para a saúde de seu espírito,
a igualdade e a liberdade para a vida de seus corações.
Creio, igualmente, que um dia toda a humanidade
reconhecerá em Deus a fonte do seu amor.
Creio que a bondade salvadora e pacífica um dia será lei.
O lobo e o cordeiro poderão repousar juntos,
todo homem poderá sentar-se sob a sua figueira, na sua vinha
e ninguém terá motivo para ter medo.
Creio firmemente que triunfaremos."
Para finalizar, no momento de Acção de Graças, saboreámos estas palavras de Manuel Alegre (A Praça da Canção, Coimbra, Centelha, 1975 [3ª ediçao]):
Para João XXIII
Porque não sei de Deus não trago preces.
Sou apenas um homem de boa vontade.
Creio nos homens que acreditam como tu nos homens
creio no teu sorriso fraternal
e no teu jeito de dizer
quase como quem semeia
as palavras que são
trigo da vida.
Creio na paz e na justiça
creio na liberdade
e creio nesse coração terreno e alto
com raízes no céu e em Sotto il Monte
De Deus não sei. Mas quase creio
que Deus poisou nas mãos cheias de terra
dum jovem camponês de Sotto il Monte.
Por isso mando à Praça de S. Pedro
não uma prece
mas a minha canção fraterna e livre
esta canção
que vai pedir-te a humana benção
João XXIII avô do século.
No Domingo, juntámo-nos para Celebrar a Vida!
Iniciámos a nossa Eucaristia com um belíssimo momento de evocação dos nossos mortos:
Charlie Haden with Josh Haden & Jerry Douglas - Spiritual
SPIRITUAL
Jesus, I don't want to die alone
Jesus, oh Jesus, I don't want to die alone
My love wasn't true
Now all I have is you
Jesus, oh Jesus, I don't want to die alone.
Jesus, if you hear my last breath
Don't leave me here
Left to die a lonely death
I know I have sinned
But Lord I'm suffering
Jesus, oh Jesus, if you hear
My last breath.
All my troubles
All my pain
Will leave me
Once again
“Depois da morte, para os mortos, já não há aniversário, porque, com a morte, sai-se do tempo e entra-se na eternidade. Na eternidade do nada ou na eternidade de Deus. Espero que na eternidade do Deus vivo e infinitamente bom.”
Anselmo Borges, Diário de Notícias 1.11.2008
Anselmo Borges, Diário de Notícias 1.11.2008
Para o momento do perdão, rezámos com um poema de Angelo Roncalli (Papa João XXIII):
HOJE, APENAS HOJE
Hoje, apenas hoje, procurarei viver pensando
apenas neste dia, sem querer resolver de uma
só vez todos os problemas da minha vida.
Hoje, apenas hoje, terei o máximo cuidado
na minha convivência: serei cordial, não criticarei
nem pretenderei melhorar ou corrigir
ninguém à força, senão a mim mesmo.
Hoje, apenas hoje, adaptar-me-ei às circunstâncias,
sem esperar que sejam todas as
circunstâncias a adaptar-se aos meus desejos.
Foi, assim, um início intenso, rico, pleno de memória: não só pelos nossos familiares e amigos mas, também, pelo 50º aniversário da eleição do Cardeal Angelo Roncalli para Papa: o Bom Papa João XXIII (28 de Outubro).
Por isso mesmo, na Liturgia da Palavra, relemos dois trechos de uma acutilante actualidade:
“O maior problema da época moderna talvez seja o das relações entre as comunidades políticas economicamente desenvolvidas e as que se encontram em fase de desenvolvimento económico; as primeiras, por conseguinte, com alto nível de vida; as outras, em condições de escassez ou de miséria. A solidariedade que une todos os seres humanos e os torna membros de uma só família, impõe aos países que dispõem com abundância de meios de subsistência o dever de não permanecerem indiferentes diante das comunidades políticas cujos membros se debatem com as dificuldades da indigência, da miséria e da fome e não gozam dos direitos elementares da pessoa humana. Tanto mais que, dada a interdependência cada vez maior entre os povos, não é possível que entre eles reine uma paz durável e fecunda, se o desnível das condições económicas for excessivo.” (Mater et Magistra, 1961)
“A todos os homens de boa vontade incumbe, pois, a imensa tarefa de restabelecer as relações de convivência, baseando-as na verdade, na justiça, no amor e na liberdade. (…) Estes homens, bem poucos certamente para tão grande tarefa, merecedores do aplauso universal, é justo que de nós recebam o elogio público, bem como uma urgente exortação a que preseverem em tão salutar empreendimento. Mas conforta-nos igualmente a esperança de que muitos outros, sobretudo de entre os cristãos, levados pela consciência do dever e pela exigência da cvaridade, virão juntar-se-lhes. Porque todos aqueles que acreditam em Cristo devem ser nesta sociedade humana como que um facho de luz, um fogo de amor, um fermento que levede toda a massa, e tanto melhor o serão quanto mais unidos estiverem com Deus.” (Pacem in Terris, 1963)
No momento da partilha, escutámos alguns testemunhos, sobre João XXIII, que nos foram trazidos pelo José Pureza; são eles do Zé Dias, da Alfreda Fonseca, do Miguel Marujo e do Anselmo Borges. Aqui ficam:
JOÃO XXIII – O PAPA DA BONDADE, DA CONCÓRDIA E DA ATENÇÃO AO ESPÍRITO SANTO
Eleito já em idade avançada e doente, mais como Papa de transição, propôs-se, para lá de duas encíclicas memoráveis (a Mater et Magistra mas sobretudo a Pacem in Terris), três grandes objectivos: reunir um Sínodo diocesano (ele era também bispo de Roma}, publicar um novo Código de Direito Canónico (o último datava de 1918) e convocar um Concílio.
Esta convocação "quase deixou em pânico" a milenar estrutura curial pelas mudanças profundas que poderia trazer. Mas também surpreendeu todo o mundo, já que se tratava de uma tarefa demasiado pesada para um "velho" de 80 anos e tão ingente que, tanto Pio XI como Pio XII que chegaram a pensar nesta ideia, não se tiveram a coragem de pô-la em
prática.
Por isso, o Concílio tem muito do modo de ser deste Papa bondoso:
- do seu estilo de vida: simplicidade, optimismo, aposta constante na reconciliação, recusa em fazer condenações e, como principal critério pastoral, a preocupação primeira pelas pessoas a quem se dirigia, o que inclusive o levou, com aquela idade, a aprender línguas: "Não é que eu pretenda fazer discursos em inglês, mas parece-me que não serei Pai se me aproximar de tantas pessoas que só conhecem o inglês e não lhes dirigir uma palavra sequer que elas entendam", escreveu ele ao seu confessor; daí também a sua grande preocupação para que a língua vernácula fosse introduzida na liturgia;
- da sua leitura dos sinais dos tempos: a Igreja estava desfasada de um mundo que avançava a passos Largos nem sempre pelos melhores caminhos; era preciso fazer o aggiornamento, "pôr em dia" a Igreja, não na sua doutrina, mas na sua vida e no modo de exprimir esse "depósito da fé" que era chamada a preservar ao serviço de um mundo melhor;
- do seu amor e estudo da história que lhe forneceu lições e elementos fundamentais: a investigação sobre a Reforma deu-lhe a conhecer melhor os irmãos separados; da história em geral aprendeu ao que conduziram as sucessivas condenações que a Igreja foi espalhando ao longo da história; por isso, o concílio não seria condenatório;
- das passagens, como núncio apostólico:
• por Sofia, Atenas e Constantinopla, que lhe permitiu conhecer o que pensava a Igreja ortodoxa da Igreja católica e experimentar ao vivo mais esta dolorosa divisão dos cristãos: dai a sua quase obsessão pelo Ut sint unum (Que todos
sejam um), a sua paixão pelo ecumenismo; esta verificação foi possivelmente uma das causas mais decisivas para a convocação do Concílio;
• por Paris, num mundo totalmente diferente, o mundo da cultura do século XX, profundamente marcado pela indiferença religiosa, que lhe fez sentir a urgência de uma profunda renovação do cristianismo; ali intuiu a necessidade daquilo que mais tarde viria a ser a Gaudium et Spes.
Esta convocação "quase deixou em pânico" a milenar estrutura curial pelas mudanças profundas que poderia trazer. Mas também surpreendeu todo o mundo, já que se tratava de uma tarefa demasiado pesada para um "velho" de 80 anos e tão ingente que, tanto Pio XI como Pio XII que chegaram a pensar nesta ideia, não se tiveram a coragem de pô-la em
prática.
Por isso, o Concílio tem muito do modo de ser deste Papa bondoso:
- do seu estilo de vida: simplicidade, optimismo, aposta constante na reconciliação, recusa em fazer condenações e, como principal critério pastoral, a preocupação primeira pelas pessoas a quem se dirigia, o que inclusive o levou, com aquela idade, a aprender línguas: "Não é que eu pretenda fazer discursos em inglês, mas parece-me que não serei Pai se me aproximar de tantas pessoas que só conhecem o inglês e não lhes dirigir uma palavra sequer que elas entendam", escreveu ele ao seu confessor; daí também a sua grande preocupação para que a língua vernácula fosse introduzida na liturgia;
- da sua leitura dos sinais dos tempos: a Igreja estava desfasada de um mundo que avançava a passos Largos nem sempre pelos melhores caminhos; era preciso fazer o aggiornamento, "pôr em dia" a Igreja, não na sua doutrina, mas na sua vida e no modo de exprimir esse "depósito da fé" que era chamada a preservar ao serviço de um mundo melhor;
- do seu amor e estudo da história que lhe forneceu lições e elementos fundamentais: a investigação sobre a Reforma deu-lhe a conhecer melhor os irmãos separados; da história em geral aprendeu ao que conduziram as sucessivas condenações que a Igreja foi espalhando ao longo da história; por isso, o concílio não seria condenatório;
- das passagens, como núncio apostólico:
• por Sofia, Atenas e Constantinopla, que lhe permitiu conhecer o que pensava a Igreja ortodoxa da Igreja católica e experimentar ao vivo mais esta dolorosa divisão dos cristãos: dai a sua quase obsessão pelo Ut sint unum (Que todos
sejam um), a sua paixão pelo ecumenismo; esta verificação foi possivelmente uma das causas mais decisivas para a convocação do Concílio;
• por Paris, num mundo totalmente diferente, o mundo da cultura do século XX, profundamente marcado pela indiferença religiosa, que lhe fez sentir a urgência de uma profunda renovação do cristianismo; ali intuiu a necessidade daquilo que mais tarde viria a ser a Gaudium et Spes.
Zé Dias 28.0ut.2008
Nos 50 anos da eleição do Papa João XXIII, recordo especialmente a sua capacidade de ler os sinais dos tempos e neles interpretar os apelos da humanidade em busca de Deus, bem como a resposta que a Fé no Deus de Amor, de Jesus Cristo, pode ser proposta a cada pessoa.
Provavelmente muitos de nós hoje não seriamos crentes se não fosse a coragem deste Papa que convocou o concílio Vaticano II.
A Igreja tinha acumulado tanta “ganga” histórica que se tinha tornado quase “opaca” à mensagem evangélica. As formas ritualistas de piedade cristã, eurocêntricas e datadas com prazo de validade expirado, tornavam-se um obstáculo a que o pensamento e a busca livre dos fiéis fosse admitido. O virar costas à Modernidade, o conservadorismo implícito e explícito tornando anátema tudo aquilo que fosse levemente distinto do centralismo (nada) democrático romano, tinha levado a Igreja e o seu precioso depósito da Fé para um beco sem saída.
A capacidade de João XXIII de saber quando e como abrir a janela e deixar entrar a ventania que foi o sopro forte do Espírito Santo e arejar a instituição reconduzindo-a à sua função inicial de mostrar o rosto de Deus através de Jesus Cristo incarnado na nossa História muito humana e diversa, é a prova que o Reino de Deus está entre nós e que é possível vivê-lo a anunciá-lo.
Era inesperado que este Papa, velho, doente e com uma carreira burocrático - eclesiástica na Santa Sé, pudesse ser em 1º lugar, eleito Papa, e depois, o protagonista da maior mudança a que a Catolicidade foi chamada no sec XX …e no entanto foi através dele que o Espírito de Deus se manifestou a todos nós. Estamos-lhe gratos por isso. Pelo menos eu estou!
Alfreda Fonseca
TÃO PERTO E TÃO LONGE
Não é fácil falar de João XXIII na minha vida. Do Bom Papa, como o chamavam e chamam, não retenho mais do que uma imagem impressionista, em que o real se mistura muitas vezes com o imaginário - aquelas em fotos rugosas de jornais amarelecidos, estas em filmes que nos mostram outra cara e esquecem a complexidade da vida pela simplicidade hagiográfica de contar uma história. O que é real foi a descoberta em fragmentos soltos, frases dispersas, excertos de textos maiores de um pensamento que nos inquietava, do sobressalto que era pensar a Igreja no mundo, sem conjunção nem adversativa porque a Igreja está no mundo, é do mundo, vive aí.
Para mim, João XXIII é pois um Papa de uma história tão longínqua como próxima, feita de atenção às pequenas coisas do mundo. Longe no tempo, próxima na inquietação de querer mudar, palavra chave para este tempo de tanta acomodação e resignação. Nos meus tempos de militante do MCE era também nas suas palavras que muitas vezes tropeçávamos à procura de notas ou apontamentos que nos dessem pistas para o nosso trabalho, mais ainda para ideias que pareciam ir contra a corrente.
Mas contra a corrente continua a ser esses monumentos de palavras que nos obrigam a parar que são Pacem in Terris, que permanece dramaticamente actual, apesar de ter sido escrita por causa da guerra fria, e Mater et Magistra, que devia ser pão para a boca para tantos nesta nossa Igreja. Afinal, recorda-nos o Papa, a abrir o documento, que "a Santa Igreja, apesar de ter, como principal missão, a de santificar as almas e de as fazer participar dos bens da ordem sobrenatural, não deixa de preocupar-se ao mesmo tempo com as exigências da vida quotidiana dos homens, não só naquilo que diz respeito ao sustento e às condições de vida, mas também no que se refere à prosperidade e à civilização em seus múltiplos aspectos, dentro do condicionamento de várias épocas."
Há 50 anos e tão actual. Devo corrigir-me: a história de Angelo Roncalli só me é próxima. De longínqua não tem nada.
Miguel Marujo
1. Impressionou-me a sua simplicidade e imenso humor. Lembro, por exemplo, aquela vez em que, já ele Papa, um aluno de um Colégio Universitário em Roma lhe perguntou como era sentir-se o primeiro no Vaticano. E ele: "Está enganado; eu estive a contá-los e devo ser o sexto ou o sétimo..."
2. Era um cristão, com bondade boa. Assim, também lembro aquela vez em que ele chegou tarde ao Varicano e havia muita gente à espera dele. Dirigiu-lhes umas breves palavras, terminando: "já é tarde; olhai para a lua que esta noite está tão bela; ide para casa e não vos esqueçais de dar um beijo meu aos filhos pequenos."
3. Porque era cristão e já se tinha apercebido de que na Igreja o ar era irrespirável, convocou um Concílio Ecuménico, na tentativa de converter a Igreja ao Evangelho e tornar os católicos cristãos, na fraternidade universal.
4. Se ele fosse vivo e ouvisse falar da vossa Comunidade João XXIII, estou convencido de que ficaria contente e dar-vos-is ânimo para continuardes.
Um abraço amigo
Anselmo
Já no Credo, rezámos esta bela oração de Martin Luther King, tendo (como música de fundo), uma lindíssima interpretação do We Shall Overcome:
Charlie Haden & Hank Jones - We Shall Overcome
"Hoje,
na noite do mundo e na esperança da Boa Nova,
eu afirmo com audácia minha fé no futuro da humanidade.
Recuso crer que as circunstâncias actuais
tornem os homens incapazes de fazer uma terra melhor.
Recuso crer que o ser humano
não seja mais do que um boneco de palha agitado pela corrente da vida,
sem ter a possibilidade de influir minimamente no curso dos acontecimentos.
Recuso-me a partilhar a opinião dos que pretendem
que o homem está de tal maneira prisioneiro da noite sem estrelas,
da guerra e do racismo,
que a aurora luminosa da paz e da fraternidade não possa nunca tornar-se realidade.
Recuso fazer minha a predição cínica
daqueles que dizem que os povos mergulharão, um após outro,
no turbilhão do militarismo, até o inferno da destruição termonuclear.
Eu creio que a verdade e o amor incondicionais
terão efectivamente a última palavra.
A vida, ainda que provisoriamente derrotada,
é sempre mais forte que a morte.
Eu creio firmemente que,
mesmo no meio das bombas que explodem e dos canhões que troam,
permanece a esperança de um amanhã radioso.
Ouso crer que, um dia, todos os habitantes da terra
poderão receber três refeições por dia para a vida de seu corpo,
a educação e a cultura para a saúde de seu espírito,
a igualdade e a liberdade para a vida de seus corações.
Creio, igualmente, que um dia toda a humanidade
reconhecerá em Deus a fonte do seu amor.
Creio que a bondade salvadora e pacífica um dia será lei.
O lobo e o cordeiro poderão repousar juntos,
todo homem poderá sentar-se sob a sua figueira, na sua vinha
e ninguém terá motivo para ter medo.
Creio firmemente que triunfaremos."
Para finalizar, no momento de Acção de Graças, saboreámos estas palavras de Manuel Alegre (A Praça da Canção, Coimbra, Centelha, 1975 [3ª ediçao]):
Para João XXIII
Porque não sei de Deus não trago preces.
Sou apenas um homem de boa vontade.
Creio nos homens que acreditam como tu nos homens
creio no teu sorriso fraternal
e no teu jeito de dizer
quase como quem semeia
as palavras que são
trigo da vida.
Creio na paz e na justiça
creio na liberdade
e creio nesse coração terreno e alto
com raízes no céu e em Sotto il Monte
De Deus não sei. Mas quase creio
que Deus poisou nas mãos cheias de terra
dum jovem camponês de Sotto il Monte.
Por isso mando à Praça de S. Pedro
não uma prece
mas a minha canção fraterna e livre
esta canção
que vai pedir-te a humana benção
João XXIII avô do século.
quinta-feira, outubro 30
"Mestre, qual é o maior Mandamento?"
Depois de iniciar a nossa Celebração, ouvimos, em jeito de Kyrie...
Rui Veloso - A Gente não Lê
O Evangelho deste 30º Domingo dava-nos nota de mais um teste que os fariseus quiseram fazer a Jesus; para a reflexão sobre as Leituras (especialmente do Evangelho), o Samelo levou-nos a apresentação que podem descarregar aqui.
Na partilha da Palavra (Ex 22, 20-26; 1 Ts 1, 5c-10; Mt 22, 34-40) quisemos saborear o texto que o Samelo nos enviou:
ENCONTRO DE DOIS AMORES
Será necessário afastar-se das pessoas para encontrar a Deus? E quem encontrou a Deus ainda poderá voltar às pessoas e viver com elas, interessar-se por elas, trabalhar com elas e para elas? Noutras palavras, são compatíveis o amor a Deus e o amor às pessoas, ou, pelo contrário, um exclui o outro, de modo que seja absolutamente necessário fazer uma opção?
Amar a pessoa humana para amar a Deus
Nenhuma destas perguntas recebeu de Jesus uma resposta essencial; o primeiro mandamento é amar a Deus e o segundo, que lhe é semelhante, amar as pessoas. Não se pode, pois, pensar que a entrada de Deus numa consciência provoque a exclusão da pessoa (cf evangelho). Pelo contrário, os textos mais seguros da mensagem do Antigo Testamento e de Jesus levam-nos a crer com certeza que o encontro com Deus renova e aperfeiçoa a atenção e a solicitude para com as pessoas (cf 1ª leitura).
“Quando Deus se revela pessoalmente, Ele fá-lo servindo-se das categorias humanas. Assim, revela-se Pai, Filho, Espírito de Amor; e revela-se supremamente na humanidade de Jesus Cristo. Por isto, não é demasiada ousadia afirmar que é preciso conhecer a pessoa humana para conhecer a Deus; é preciso amar a pessoa humana para amar a Deus” (RdC 122, b). “Deus marcou seu encontro com o homem em todas as coisas. Nelas o homem pode encontrar Deus. Por isso todas as coisas deste mundo são ou podem ser sacramentais. Cristo é o lugar de encontro por excelência: nEle Deus está de forma humana e o homem de forma divina. A fé sempre viu e acreditou que em Jesus de Nazaré morto e ressuscitado Deus e o Homem se encontram numa unidade profunda, sem divisão e sem confusão. Pelo homem-Jesus se vai a Deus e pelo Deus-Jesus se vai ao homem. Ele é caminho e termo final do caminho. Nele se encontram os dois movimentos, ascendente e descendente: por um lado é a expressão palpável do amor de Deus (movimento descendente) e por outro é a forma definitiva do amor do homem (movimento ascendente). Quem dialogava com Cristo se encontrava com Deus. (…) Ele foi a própria Abnegação, o radical Amor ao próximo e a exaustiva Dedicação. Porque era(é) sacramento” (Leonardo Boff, Os sacramentos da Vida e a Vida dos sacramentos. Ensaio de teologia narrativa, Editora Vozes, Petrópolis, 200121, pp. 46.47).
Mas convém aprofundar alguns problemas impostos pelos próprios textos evangélicos. Importa amar as pessoas, mas importa também acautelar se em relação ao mundo, saber deixar o pai e a mãe.
Como fazer um acordo entre proposições que, à primeira vista, parecem opor-se? Devendo absolutamente escolher entre a pessoa humana e Deus, que fazer? O amor das pessoas não é uma ameaça ao amor de Deus?
A Escritura e a tradição cristã nunca permitiram ao(à) cristão(ã) desinteressar-se da pessoa humana sob pretexto de interessar-se unicamente por Deus. Nunca deixaram de indicar no serviço da pessoa humana um modo de servir a Deus.
Teoria e práxis
A atenção a Deus e a atenção à pessoa humana não são facilmente separáveis. O cultivo da “vida interior’’ é um valor cristão, um valor permanente, como a necessidade de recolhimento. Mas a “vida interior”, quando é cristã, não é monólogo nem falar com Deus só. Encontrando Deus na oração, o(a) cristão(ã), mais cedo ou mais tarde, encontra inevitavelmente as pessoas que Deus cria e quer salvar. Ele(ela) não pode deixar de subscrever estas linhas de Paul Ricoeur: “A minha vida interior é a fonte de minhas relações exteriores. Contrariamente à sabedoria meditativa e contemplativa do fim do paganismo grego ou do Oriente, a pregação cristã jamais opôs o ser ao fazer, o interior ao exterior, a teoria à práxis, a oração à vida, a fé às obras, Deus ao próximo. É sempre no momento em que a comunidade cristã se desfaz ou a fé decai, que ela abandona o mundo e suas responsabilidades. reconstruindo o mito da interioridade. Então, Cristo não é mais reconhecido na pessoa do pobre, do exilado, do prisioneiro”.
Contemplação e acção
O cristão pode afastar-se momentaneamente das pessoas, para orar, para pensar só em Deus. Pode fazer uma hora de meditação sem encontrar expressamente, na contemplação do mistério divino, o pensamento das necessidades das pessoas. Isto torna-se mesmo, em certos momentos, uma profunda necessidade. Na vida cristã, como na vida humana em geral, existem normalmente ritmos; passa-se da contemplação à acção e desta à contemplação. Mas o afastamento das pessoas é sempre e apenas provisório. Assim como acontece na nossa existência, em que se sucedem tempos de retiro e tempos de intensa actividade, também na Igreja vemos contemplativos e activos. O mistério de Cristo, no seu todo, é vivido na Igreja, no conjunto de seus membros e em todos os séculos. O contemplativo serve as pessoas servindo a Deus; o activo serve a Deus servindo as pessoas. Os dois exprimem, especializando-se na imitação de Cristo, um mesmo e único mistério: o da vida religiosa do Verbo encarnado. Assim aconteceu e acontece ainda na história da Igreja. “A luz dos povos é Cristo: por isso, este sagrado Concílio, reunido no Espírito Santo, (…) propõe-se declarar, com maior insistência, aos seus fiéis e ao mundo inteiro, a natureza e a missão universal da Igreja, que em Cristo, é como que o sacramento ou sinal e instrumento da íntima união com Deus e da unidade de todo o género humano. As condições deste tempo tornam maior a urgência deste dever da Igreja, a fim de que todos os homens, hoje mais intimamente unidos por toda a espécie de vínculos sociais, técnicos e culturais, alcancem a unidade total em Cristo” (Concílio Ecuménico Vaticano II, Constituição Dogmática Lumen Gentium, n. 1).
A Palavra se faz Eucaristia
Não existe oposição entre o amor a Deus e o amor à pessoa humana - aliás, Ele é o seu melhor aliado. A assembleia eucarística, convocada pelo amor do Pai, realiza ao mesmo tempo o duplo mandamento: unidos na caridade fraterna nós dirigimo-nos a Deus como filhos(as).
Cristo, vindo também ao nosso meio no memorial do Seu sacrifício que é a Eucaristia, mostra-nos como se pode realizar um inteiro amor ao Pai e uma total doação aos(às) irmãos(ãs).
(in: Missal dominical. Missal da assembleia cristã, Edições Paulinas, São Paulo, 1987, pp. 801-802.806 - adaptadas)
Depois, o Credo foi rezado assim:
Mercedes Sosa - Credo
No momento de acção de graças, lemos este texto do saudoso D. Hélder Câmara:
Que toda a palavra
nasça
da acção e da meditação.
Sem acção
ou tendência à acção
ela será apenas teoria
que se juntará
ao excesso de teoria
que está levando os jovens
ao desespero.
Se ela é apenas acção
sem meditação
ela acabará no activismo
sem fundamento,
sem conteúdo,
sem força...
Presta honras ao Verbo eterno
servindo-te da palavra
de forma
a recriar o mundo.
(Dom Hélder Câmara, O Deserto é Fértil (Roteiros para as Minorias Abraâmicas), Rio de Janeiro, Editora Civilização Brasileira S.A., 1976, p. 109)
Não podia haver momento mais certo para a La-Salete nos anunciar que gostaria de baptizar o João, seu filho e do Alexandre, no seio da nossa Comunidade. A Festa ficou marcada para o próximo dia 7 de Dezembro, em pleno Advento.
Quisemos que o Cântico final fosse este...
Jason Donovan - Any dream will do
Rui Veloso - A Gente não Lê
O Evangelho deste 30º Domingo dava-nos nota de mais um teste que os fariseus quiseram fazer a Jesus; para a reflexão sobre as Leituras (especialmente do Evangelho), o Samelo levou-nos a apresentação que podem descarregar aqui.
Na partilha da Palavra (Ex 22, 20-26; 1 Ts 1, 5c-10; Mt 22, 34-40) quisemos saborear o texto que o Samelo nos enviou:
ENCONTRO DE DOIS AMORES
Será necessário afastar-se das pessoas para encontrar a Deus? E quem encontrou a Deus ainda poderá voltar às pessoas e viver com elas, interessar-se por elas, trabalhar com elas e para elas? Noutras palavras, são compatíveis o amor a Deus e o amor às pessoas, ou, pelo contrário, um exclui o outro, de modo que seja absolutamente necessário fazer uma opção?
Amar a pessoa humana para amar a Deus
Nenhuma destas perguntas recebeu de Jesus uma resposta essencial; o primeiro mandamento é amar a Deus e o segundo, que lhe é semelhante, amar as pessoas. Não se pode, pois, pensar que a entrada de Deus numa consciência provoque a exclusão da pessoa (cf evangelho). Pelo contrário, os textos mais seguros da mensagem do Antigo Testamento e de Jesus levam-nos a crer com certeza que o encontro com Deus renova e aperfeiçoa a atenção e a solicitude para com as pessoas (cf 1ª leitura).
“Quando Deus se revela pessoalmente, Ele fá-lo servindo-se das categorias humanas. Assim, revela-se Pai, Filho, Espírito de Amor; e revela-se supremamente na humanidade de Jesus Cristo. Por isto, não é demasiada ousadia afirmar que é preciso conhecer a pessoa humana para conhecer a Deus; é preciso amar a pessoa humana para amar a Deus” (RdC 122, b). “Deus marcou seu encontro com o homem em todas as coisas. Nelas o homem pode encontrar Deus. Por isso todas as coisas deste mundo são ou podem ser sacramentais. Cristo é o lugar de encontro por excelência: nEle Deus está de forma humana e o homem de forma divina. A fé sempre viu e acreditou que em Jesus de Nazaré morto e ressuscitado Deus e o Homem se encontram numa unidade profunda, sem divisão e sem confusão. Pelo homem-Jesus se vai a Deus e pelo Deus-Jesus se vai ao homem. Ele é caminho e termo final do caminho. Nele se encontram os dois movimentos, ascendente e descendente: por um lado é a expressão palpável do amor de Deus (movimento descendente) e por outro é a forma definitiva do amor do homem (movimento ascendente). Quem dialogava com Cristo se encontrava com Deus. (…) Ele foi a própria Abnegação, o radical Amor ao próximo e a exaustiva Dedicação. Porque era(é) sacramento” (Leonardo Boff, Os sacramentos da Vida e a Vida dos sacramentos. Ensaio de teologia narrativa, Editora Vozes, Petrópolis, 200121, pp. 46.47).
Mas convém aprofundar alguns problemas impostos pelos próprios textos evangélicos. Importa amar as pessoas, mas importa também acautelar se em relação ao mundo, saber deixar o pai e a mãe.
Como fazer um acordo entre proposições que, à primeira vista, parecem opor-se? Devendo absolutamente escolher entre a pessoa humana e Deus, que fazer? O amor das pessoas não é uma ameaça ao amor de Deus?
A Escritura e a tradição cristã nunca permitiram ao(à) cristão(ã) desinteressar-se da pessoa humana sob pretexto de interessar-se unicamente por Deus. Nunca deixaram de indicar no serviço da pessoa humana um modo de servir a Deus.
Teoria e práxis
A atenção a Deus e a atenção à pessoa humana não são facilmente separáveis. O cultivo da “vida interior’’ é um valor cristão, um valor permanente, como a necessidade de recolhimento. Mas a “vida interior”, quando é cristã, não é monólogo nem falar com Deus só. Encontrando Deus na oração, o(a) cristão(ã), mais cedo ou mais tarde, encontra inevitavelmente as pessoas que Deus cria e quer salvar. Ele(ela) não pode deixar de subscrever estas linhas de Paul Ricoeur: “A minha vida interior é a fonte de minhas relações exteriores. Contrariamente à sabedoria meditativa e contemplativa do fim do paganismo grego ou do Oriente, a pregação cristã jamais opôs o ser ao fazer, o interior ao exterior, a teoria à práxis, a oração à vida, a fé às obras, Deus ao próximo. É sempre no momento em que a comunidade cristã se desfaz ou a fé decai, que ela abandona o mundo e suas responsabilidades. reconstruindo o mito da interioridade. Então, Cristo não é mais reconhecido na pessoa do pobre, do exilado, do prisioneiro”.
Contemplação e acção
O cristão pode afastar-se momentaneamente das pessoas, para orar, para pensar só em Deus. Pode fazer uma hora de meditação sem encontrar expressamente, na contemplação do mistério divino, o pensamento das necessidades das pessoas. Isto torna-se mesmo, em certos momentos, uma profunda necessidade. Na vida cristã, como na vida humana em geral, existem normalmente ritmos; passa-se da contemplação à acção e desta à contemplação. Mas o afastamento das pessoas é sempre e apenas provisório. Assim como acontece na nossa existência, em que se sucedem tempos de retiro e tempos de intensa actividade, também na Igreja vemos contemplativos e activos. O mistério de Cristo, no seu todo, é vivido na Igreja, no conjunto de seus membros e em todos os séculos. O contemplativo serve as pessoas servindo a Deus; o activo serve a Deus servindo as pessoas. Os dois exprimem, especializando-se na imitação de Cristo, um mesmo e único mistério: o da vida religiosa do Verbo encarnado. Assim aconteceu e acontece ainda na história da Igreja. “A luz dos povos é Cristo: por isso, este sagrado Concílio, reunido no Espírito Santo, (…) propõe-se declarar, com maior insistência, aos seus fiéis e ao mundo inteiro, a natureza e a missão universal da Igreja, que em Cristo, é como que o sacramento ou sinal e instrumento da íntima união com Deus e da unidade de todo o género humano. As condições deste tempo tornam maior a urgência deste dever da Igreja, a fim de que todos os homens, hoje mais intimamente unidos por toda a espécie de vínculos sociais, técnicos e culturais, alcancem a unidade total em Cristo” (Concílio Ecuménico Vaticano II, Constituição Dogmática Lumen Gentium, n. 1).
A Palavra se faz Eucaristia
Não existe oposição entre o amor a Deus e o amor à pessoa humana - aliás, Ele é o seu melhor aliado. A assembleia eucarística, convocada pelo amor do Pai, realiza ao mesmo tempo o duplo mandamento: unidos na caridade fraterna nós dirigimo-nos a Deus como filhos(as).
Cristo, vindo também ao nosso meio no memorial do Seu sacrifício que é a Eucaristia, mostra-nos como se pode realizar um inteiro amor ao Pai e uma total doação aos(às) irmãos(ãs).
(in: Missal dominical. Missal da assembleia cristã, Edições Paulinas, São Paulo, 1987, pp. 801-802.806 - adaptadas)
2008-10-24
António Samelo
António Samelo
Depois, o Credo foi rezado assim:
Mercedes Sosa - Credo
No momento de acção de graças, lemos este texto do saudoso D. Hélder Câmara:
Que toda a palavra
nasça
da acção e da meditação.
Sem acção
ou tendência à acção
ela será apenas teoria
que se juntará
ao excesso de teoria
que está levando os jovens
ao desespero.
Se ela é apenas acção
sem meditação
ela acabará no activismo
sem fundamento,
sem conteúdo,
sem força...
Presta honras ao Verbo eterno
servindo-te da palavra
de forma
a recriar o mundo.
(Dom Hélder Câmara, O Deserto é Fértil (Roteiros para as Minorias Abraâmicas), Rio de Janeiro, Editora Civilização Brasileira S.A., 1976, p. 109)
Não podia haver momento mais certo para a La-Salete nos anunciar que gostaria de baptizar o João, seu filho e do Alexandre, no seio da nossa Comunidade. A Festa ficou marcada para o próximo dia 7 de Dezembro, em pleno Advento.
Quisemos que o Cântico final fosse este...
Jason Donovan - Any dream will do
segunda-feira, outubro 20
Dar a César o que é de César e a Deus o que é de Deus!...
Mais uma vez o Samelo preparou-nos um texto e trouxe-nos duas apresentações para nos ajudar a reflectir. Aqui ficam estes documentos:
«Os nn. 42-44 da Constituição Pastoral Gaudium et Spes do Concílio Ecuménico Vaticano II são um bom comentário às leituras bíblicas Is 45, 1.4-6; 1 Ts 1, 1-5b; Mt 22, 15-21 do 29º DOMINGO DO TEMPO COMUM - Ano A (2008-10-19)
Ajuda que a Igreja oferece à sociedade
42. (…) O Concílio considera com muito respeito o que há de bom, verdadeiro e justo nas instituições tão diversas que o género humano criou e sem cessar continua a criar. (…) Ela nada deseja mais ardentemente do que, servindo o bem de todos, poder desenvolver-se livremente sob qualquer regime que reconheça os direitos fundamentais da pessoa e da família e os imperativos do bem comum.
Ajuda que a Igreja oferece à actividade humana
43. O Concílio exorta os cristãos, cidadãos de ambas as cidades, a que procurem cumprir fielmente os seus deveres terrenos, guiados pelo espírito do Evangelho. Afastam-se da verdade os que, sabendo que não temos aqui na terra uma cidade permanente, mas que vamos em demanda da futura, pensam que podem por isso descuidar os seus deveres terrenos, sem atenderem a que a própria fé ainda os obriga mais a cumpri-los, segundo a vocação própria de cada um. Mas não menos erram os que, pelo contrário, opinam poder entregar-se às ocupações terrenas, como se estas fossem inteiramente alheias à vida religiosa, a qual pensam consistir apenas no cumprimento dos actos de culto e de certos deveres morais. Este divórcio entre a fé que professam e o comportamento quotidiano de muitos deve ser contado entre os mais graves erros do nosso tempo. (…). Não se oponham, pois, infundadamente, as actividades profissionais e sociais, por um lado, e a vida religiosa, por outro. O cristão que descuida os seus deveres temporais, falta aos seus deveres para com o próximo e até para com o próprio Deus, e põe em risco a sua salvação eterna. (…)
As tarefas e actividades seculares competem como próprias, embora não exclusivamente, aos leigos. Por esta razão, sempre que, sós ou associados, actuam como cidadãos do mundo, não só devem respeitar as leis próprias de cada domínio, mas procurarão alcançar neles uma real competência. Cooperarão de boa vontade com os homens que prosseguem os mesmos fins. Reconhecendo quais são as exigências da fé, e por ela robustecidos, não hesitem, quando for oportuno, em idear novas iniciativas e levá-las a realização. Compete à sua consciência previamente bem formada, imprimir a lei divina na vida da cidade terrestre. Dos presbíteros, esperem os leigos a luz e força espiritual. Mas não pensem que os seus pastores estão sempre de tal modo preparados que tenham uma solução pronta para qualquer questão, mesmo grave, que surja, ou que tal é a sua missão. Antes, esclarecidos pela sabedoria cristã, e atendendo à doutrina do magistério, tomem por si mesmos as próprias responsabilidades.
Muitas vezes, a concepção cristã da vida incliná-los-á para determinada solução, em certas circunstâncias concretas. Outros fiéis, porém, com não menos sinceridade, pensarão diferentemente acerca do mesmo assunto, como tantas vezes acontece, e legitimamente. Embora as soluções propostas por uma e outra parte, mesmo independentemente da sua intenção, sejam por muitos facilmente vinculadas à mensagem evangélica, devem, no entanto, lembrar-se de que a ninguém é permitido, em tais casos, invocar exclusivamente a favor da própria opinião a autoridade da Igreja. Mas procurem sempre esclarecer-se mutuamente, num diálogo sincero, salvaguardando a caridade recíproca e atendendo, antes de mais, ao bem comum.
Os leigos, que devem tomar parte activa em toda a vida da Igreja, não devem apenas impregnar o mundo com o espírito cristão, mas são também chamados a serem testemunhas de Cristo, em todas as circunstâncias, no seio da comunidade humana.
Quanto aos bispos, a quem está confiado o encargo de governar a Igreja de Deus, preguem juntamente com os seus presbíteros a mensagem de Cristo de tal maneira que todas as actividades terrenas dos fiéis sejam penetradas pela luz do Evangelho. Lembrem-se, além disso, os pastores que, com o seu comportamento e solicitude quotidianos, manifestam ao mundo o rosto da Igreja com base no qual os homens julgam da força e da verdade da mensagem cristã. Com a sua vida e palavra, juntos com os religiosos e os seus fiéis, mostrem que a Igreja, com todos os dons que contém em si, é só pela sua simples presença uma fonte inexaurível daquelas virtudes de que tanto necessita o mundo de hoje. Por meio de assíduo estudo, tornem-se capazes de tomar parte no diálogo com o mundo e com os homens de qualquer opinião. Mas sobretudo, tenham no seu coração as palavras deste Concílio: «Dado que o género humano caminha hoje cada vez mais para a unidade civil, económica e social, tanto mais necessário é que os presbíteros em conjunto e sob a direcção dos bispos e do Sumo Pontífice, evitem todo o motivo de divisão, para que a humanidade toda seja conduzida à unidade da família de Deus».
Ainda que a Igreja, pela virtude do Espírito Santo, se tenha mantido esposa fiel do Senhor e nunca tenha deixado de ser um sinal de salvação no mundo, no entanto, ela não ignora que entre os seus membros, clérigos ou leigos, não faltaram, no decurso de tantos séculos, alguns que foram infiéis ao Espírito de Deus. E também nos nossos dias, a Igreja não deixa de ver quanta distância separa a mensagem por ela proclamada e a humana fraqueza daqueles a quem foi confiado o Evangelho. Seja qual for o juízo da história acerca destas deficiências, devemos delas ter consciência e combatê-las com vigor, para que não sejam obstáculo à difusão do Evangelho. Também sabe a Igreja quanto deve aprender com a experiência dos séculos, no que se refere ao desenvolvimento das suas relações com o mundo. Conduzida pelo Espírito Santo, a Igreja mãe «exorta sem cessar os seus filhos a que se purifiquem e renovem, para que o sinal de Cristo brilhe mais claramente no rosto da Igreja».
Ajuda que a Igreja recebe do mundo
44. Assim como é do interesse do mundo que ele reconheça a Igreja como realidade social da história e seu fermento, assim também a Igreja não ignora quanto recebeu da história e evolução do género humano.
A experiência dos séculos passados, os progressos científicos, os tesoiros encerrados nas várias formas de cultura humana, os quais manifestam mais plenamente a natureza do homem e abrem novos caminhos para a verdade, aproveitam igualmente à Igreja. Ela aprendeu, desde os começos da sua história, a formular a mensagem de Cristo por meio dos conceitos e línguas dos diversos povos, e procurou ilustrá-la com o saber filosófico. Tudo isto com o fim de “adaptar”(inculturar) o Evangelho à capacidade de compreensão de todos e às exigências dos sábios. Esta maneira “adaptada”(inculturada) de pregar a palavra revelada deve permanecer a lei de toda a evangelização. Deste modo, com efeito, suscita-se em cada nação a possibilidade de exprimir a mensagem de Cristo segundo a sua maneira própria, ao mesmo tempo que se fomenta um intercâmbio vivo entre a Igreja e as diversas culturas dos diferentes povos. Para aumentar este intercâmbio, necessita especialmente a Igreja - sobretudo hoje, em que tudo muda tão rapidamente e os modos de pensar variam tanto - da ajuda daqueles que, vivendo no mundo, conhecem bem o espírito e conteúdo das várias instituições e disciplinas, sejam eles crentes ou não. É dever de todo o Povo de Deus e sobretudo dos pastores e teólogos, com a ajuda do Espírito Santo, saber ouvir, discernir e interpretar as várias linguagens do nosso tempo, e julgá-las à luz da palavra de Deus, de modo que a verdade revelada possa ser cada vez mais intimamente percebida, melhor compreendida e apresentada de um modo conveniente.
Como a Igreja tem uma estrutura social visível, sinal da sua unidade em Cristo, pode também ser enriquecida, e de facto o é, com a evolução da vida social. Não porque falte algo na constituição que Cristo lhe deu, mas para mais profundamente a conhecer e melhor a exprimir e para a adaptar mais convenientemente aos nossos tempos. Ela verifica com gratidão que, tanto no seu conjunto como em cada um dos seus filhos, recebe variadas ajudas dos homens de toda a classe e condição. Na realidade, todos os que, de acordo com a vontade de Deus, promovem a comunidade humana no plano familiar, cultural, da vida económica e social e também política, seja nacional ou internacional, prestam não pequena ajuda à comunidade eclesial, na medida em que esta depende das realidades exteriores.
Mais ainda, a Igreja reconhece que muito aproveitou e pode aproveitar da própria oposição daqueles que a hostilizam e perseguem.»
As apresentações podem ser descarregadas aqui e aqui.
«Os nn. 42-44 da Constituição Pastoral Gaudium et Spes do Concílio Ecuménico Vaticano II são um bom comentário às leituras bíblicas Is 45, 1.4-6; 1 Ts 1, 1-5b; Mt 22, 15-21 do 29º DOMINGO DO TEMPO COMUM - Ano A (2008-10-19)
Ajuda que a Igreja oferece à sociedade
42. (…) O Concílio considera com muito respeito o que há de bom, verdadeiro e justo nas instituições tão diversas que o género humano criou e sem cessar continua a criar. (…) Ela nada deseja mais ardentemente do que, servindo o bem de todos, poder desenvolver-se livremente sob qualquer regime que reconheça os direitos fundamentais da pessoa e da família e os imperativos do bem comum.
Ajuda que a Igreja oferece à actividade humana
43. O Concílio exorta os cristãos, cidadãos de ambas as cidades, a que procurem cumprir fielmente os seus deveres terrenos, guiados pelo espírito do Evangelho. Afastam-se da verdade os que, sabendo que não temos aqui na terra uma cidade permanente, mas que vamos em demanda da futura, pensam que podem por isso descuidar os seus deveres terrenos, sem atenderem a que a própria fé ainda os obriga mais a cumpri-los, segundo a vocação própria de cada um. Mas não menos erram os que, pelo contrário, opinam poder entregar-se às ocupações terrenas, como se estas fossem inteiramente alheias à vida religiosa, a qual pensam consistir apenas no cumprimento dos actos de culto e de certos deveres morais. Este divórcio entre a fé que professam e o comportamento quotidiano de muitos deve ser contado entre os mais graves erros do nosso tempo. (…). Não se oponham, pois, infundadamente, as actividades profissionais e sociais, por um lado, e a vida religiosa, por outro. O cristão que descuida os seus deveres temporais, falta aos seus deveres para com o próximo e até para com o próprio Deus, e põe em risco a sua salvação eterna. (…)
As tarefas e actividades seculares competem como próprias, embora não exclusivamente, aos leigos. Por esta razão, sempre que, sós ou associados, actuam como cidadãos do mundo, não só devem respeitar as leis próprias de cada domínio, mas procurarão alcançar neles uma real competência. Cooperarão de boa vontade com os homens que prosseguem os mesmos fins. Reconhecendo quais são as exigências da fé, e por ela robustecidos, não hesitem, quando for oportuno, em idear novas iniciativas e levá-las a realização. Compete à sua consciência previamente bem formada, imprimir a lei divina na vida da cidade terrestre. Dos presbíteros, esperem os leigos a luz e força espiritual. Mas não pensem que os seus pastores estão sempre de tal modo preparados que tenham uma solução pronta para qualquer questão, mesmo grave, que surja, ou que tal é a sua missão. Antes, esclarecidos pela sabedoria cristã, e atendendo à doutrina do magistério, tomem por si mesmos as próprias responsabilidades.
Muitas vezes, a concepção cristã da vida incliná-los-á para determinada solução, em certas circunstâncias concretas. Outros fiéis, porém, com não menos sinceridade, pensarão diferentemente acerca do mesmo assunto, como tantas vezes acontece, e legitimamente. Embora as soluções propostas por uma e outra parte, mesmo independentemente da sua intenção, sejam por muitos facilmente vinculadas à mensagem evangélica, devem, no entanto, lembrar-se de que a ninguém é permitido, em tais casos, invocar exclusivamente a favor da própria opinião a autoridade da Igreja. Mas procurem sempre esclarecer-se mutuamente, num diálogo sincero, salvaguardando a caridade recíproca e atendendo, antes de mais, ao bem comum.
Os leigos, que devem tomar parte activa em toda a vida da Igreja, não devem apenas impregnar o mundo com o espírito cristão, mas são também chamados a serem testemunhas de Cristo, em todas as circunstâncias, no seio da comunidade humana.
Quanto aos bispos, a quem está confiado o encargo de governar a Igreja de Deus, preguem juntamente com os seus presbíteros a mensagem de Cristo de tal maneira que todas as actividades terrenas dos fiéis sejam penetradas pela luz do Evangelho. Lembrem-se, além disso, os pastores que, com o seu comportamento e solicitude quotidianos, manifestam ao mundo o rosto da Igreja com base no qual os homens julgam da força e da verdade da mensagem cristã. Com a sua vida e palavra, juntos com os religiosos e os seus fiéis, mostrem que a Igreja, com todos os dons que contém em si, é só pela sua simples presença uma fonte inexaurível daquelas virtudes de que tanto necessita o mundo de hoje. Por meio de assíduo estudo, tornem-se capazes de tomar parte no diálogo com o mundo e com os homens de qualquer opinião. Mas sobretudo, tenham no seu coração as palavras deste Concílio: «Dado que o género humano caminha hoje cada vez mais para a unidade civil, económica e social, tanto mais necessário é que os presbíteros em conjunto e sob a direcção dos bispos e do Sumo Pontífice, evitem todo o motivo de divisão, para que a humanidade toda seja conduzida à unidade da família de Deus».
Ainda que a Igreja, pela virtude do Espírito Santo, se tenha mantido esposa fiel do Senhor e nunca tenha deixado de ser um sinal de salvação no mundo, no entanto, ela não ignora que entre os seus membros, clérigos ou leigos, não faltaram, no decurso de tantos séculos, alguns que foram infiéis ao Espírito de Deus. E também nos nossos dias, a Igreja não deixa de ver quanta distância separa a mensagem por ela proclamada e a humana fraqueza daqueles a quem foi confiado o Evangelho. Seja qual for o juízo da história acerca destas deficiências, devemos delas ter consciência e combatê-las com vigor, para que não sejam obstáculo à difusão do Evangelho. Também sabe a Igreja quanto deve aprender com a experiência dos séculos, no que se refere ao desenvolvimento das suas relações com o mundo. Conduzida pelo Espírito Santo, a Igreja mãe «exorta sem cessar os seus filhos a que se purifiquem e renovem, para que o sinal de Cristo brilhe mais claramente no rosto da Igreja».
Ajuda que a Igreja recebe do mundo
44. Assim como é do interesse do mundo que ele reconheça a Igreja como realidade social da história e seu fermento, assim também a Igreja não ignora quanto recebeu da história e evolução do género humano.
A experiência dos séculos passados, os progressos científicos, os tesoiros encerrados nas várias formas de cultura humana, os quais manifestam mais plenamente a natureza do homem e abrem novos caminhos para a verdade, aproveitam igualmente à Igreja. Ela aprendeu, desde os começos da sua história, a formular a mensagem de Cristo por meio dos conceitos e línguas dos diversos povos, e procurou ilustrá-la com o saber filosófico. Tudo isto com o fim de “adaptar”(inculturar) o Evangelho à capacidade de compreensão de todos e às exigências dos sábios. Esta maneira “adaptada”(inculturada) de pregar a palavra revelada deve permanecer a lei de toda a evangelização. Deste modo, com efeito, suscita-se em cada nação a possibilidade de exprimir a mensagem de Cristo segundo a sua maneira própria, ao mesmo tempo que se fomenta um intercâmbio vivo entre a Igreja e as diversas culturas dos diferentes povos. Para aumentar este intercâmbio, necessita especialmente a Igreja - sobretudo hoje, em que tudo muda tão rapidamente e os modos de pensar variam tanto - da ajuda daqueles que, vivendo no mundo, conhecem bem o espírito e conteúdo das várias instituições e disciplinas, sejam eles crentes ou não. É dever de todo o Povo de Deus e sobretudo dos pastores e teólogos, com a ajuda do Espírito Santo, saber ouvir, discernir e interpretar as várias linguagens do nosso tempo, e julgá-las à luz da palavra de Deus, de modo que a verdade revelada possa ser cada vez mais intimamente percebida, melhor compreendida e apresentada de um modo conveniente.
Como a Igreja tem uma estrutura social visível, sinal da sua unidade em Cristo, pode também ser enriquecida, e de facto o é, com a evolução da vida social. Não porque falte algo na constituição que Cristo lhe deu, mas para mais profundamente a conhecer e melhor a exprimir e para a adaptar mais convenientemente aos nossos tempos. Ela verifica com gratidão que, tanto no seu conjunto como em cada um dos seus filhos, recebe variadas ajudas dos homens de toda a classe e condição. Na realidade, todos os que, de acordo com a vontade de Deus, promovem a comunidade humana no plano familiar, cultural, da vida económica e social e também política, seja nacional ou internacional, prestam não pequena ajuda à comunidade eclesial, na medida em que esta depende das realidades exteriores.
Mais ainda, a Igreja reconhece que muito aproveitou e pode aproveitar da própria oposição daqueles que a hostilizam e perseguem.»
2008-10-18
António Samelo
António Samelo
As apresentações podem ser descarregadas aqui e aqui.
segunda-feira, outubro 13
duas reflexões...
O Samelo enviou-nos, entretanto, dois textos para nos fazer reflectir: um, a propósito da Oração, referido pela Kuki na Celebração do 27º Domingo do Tempo Comum (5. Outº); o outro, da Gaudium et Spes (nº 88), na linha das leituras e da nossa reflexão de ontem.
Aqui ficam.
A “lectio divina” supõe, pois, um encontro com Deus que nos fala através da Sua Palavra; um diálogo em que pouco a pouco vamos conhecendo o mistério de Cristo (São Jerónimo dizia: «desconhecer as Escrituras é desconhecer Cristo») e o coração de Deus (São Gregório Magno exortava: «conhece o coração de Deus através da Palavra de Deus»).
O itinerário da “lectio divina” tem quatro etapas:
1ª – LEITURA: é o ponto de partida e deve fazer-se com respeito. Consiste em ler e reler o texto, identificando os personagens e a acção, perguntando-se pelo contexto e pelos destinatários. Devem ter-se em conta os factores históricos (em que época se situa a acção? qual era a situação dos destinatários?), os literários (que recursos literários utiliza o autor? trata-se de um relato, de um poema, de um código legal...?) e teológicos [que experiência de fé transmite? que nos diz acerca de Deus, da(s) cultura(s), da história, de nós mesmos?]. É muito importante aproximar-se do texto sem preconceitos e sem projectar a nossa subjectividade. A pergunta que devemos fazer-nos nesta primeira etapa do itinerário é esta: o que é que, no seu contexto, o texto diz?
2ª – MEDITAÇÃO: a meditação consiste em absorver o texto até descobrir a mensagem que ele tem para nós. Na meditação há um diálogo entre o que Deus nos diz com a Sua Palavra e a nossa vida. A mensagem do texto ganha, deste modo, actualidade e converte-se numa mensagem para mim (nós). A meditação supõe um esforço de reflexão que põe em acção a nossa inteligência. A pergunta não é já: o que é que diz o texto no seu contexto, mas sim: o que é que o texto me (nos) diz na minha (nossa) situação?
3ª – ORAÇÃO: a leitura e meditação do texto conduzem-nos à oração. Com ela se inicia a terceira parte do diálogo. Até agora tentámos escutar Deus que nos fala pela Sua Palavra, mas esta escuta leva-nos ao encontro d’Aquele cuja Palavra escutámos. Na oração entra em jogo o coração e os sentimentos. É uma resposta muito nossa, que se exprime na súplica, no louvor, na acção de graças, no queixume... A pergunta aqui é: o que é que o texto me pede que diga a Deus?
4ª – CONTEMPLAÇÃO: é a etapa final de todo este caminho. Nela se transcende a multiplicidade de sentimentos e reflexões, para centrar a atenção no mistério de Jesus, o Filho de Deus; um mistério de que falam todas as páginas da Escritura e, dum modo especial, o Novo Testamento. Este encontro profundo proporciona um novo olhar sobre Deus, sobre a pessoa humana e sobre a(s) cultura(s) e revela o desígnio e a vontade de Deus. A contemplação não supõe, de nenhuma maneira, uma evasão da realidade, mas o entrar mais profundamente na história e no desígnio de Deus, levando-nos ao compromisso e à acção para tornar presente na(s) cultura(s) esse desígnio salvador: quem contempla transforma-se no contemplado: Cristo Jesus, a Palavra feita carne (cf Gl 2, 20).
(in: LA CASA DE LA BIBLIA, Curso de iniciação à leitura da Bíblia, Gráfica de Coimbra - Difusora Bíblica, Coimbra, 1996. p. 29)
Is 25, 6-10a; Fl 4, 12-14.19-20; Mt 22, 1-14
Comentário:
«Os cristãos hão-de cooperar de bom grado e de todo o coração na construção da ordem internacional, com respeito sincero pelas legítimas liberdades e na amiga fraternidade de todos, e isto tanto mais quanto a maior parte do globo sofre ainda de tanta pobreza que o próprio Cristo, na pessoa dos pobres, apela em alta voz para a caridade dos seus discípulos. Não se dê, pois, aos homens o escândalo que consiste no facto de algumas nações, das quais muitas vezes a maioria dos habitantes se diz cristã, gozarem de abundância de bens, enquanto outras estão privadas dos bens mais necessários para vida e são atormentadas pela fome, pelas doenças e por toda espécie de miséria. O espírito de pobreza e de caridade são, com efeito, a glória e o sinal da Igreja de Cristo.
Devem, portanto, ser louvados e ajudados aqueles cristãos, sobretudo jovens, que se oferecem espontaneamente para prestar auxílio a outros homens e povos. Além disso, é dever de todo o Povo de Deus, precedido pelo exemplo e pela palavra dos Bispos, aliviar, na medida das suas forças, as misérias deste tempo, e isto, como era costume antigo da Igreja, não só com o supérfluo, mas também com o necessário.
Embora o modo de reunir e distribuir os auxílios não seja organizado de forma rígida e uniforme, deve contudo obedecer a uma recta ordem nas dioceses, nos países e em todo o mundo, e onde parecer oportuno, conjugando a acção dos católicos com a dos outros irmãos cristãos. Com efeito, o espírito de caridade, muito longe de se opor ao exercício prudente e ordenado da acção social e caritativa, antes o impõe. Por isso, é necessário que aqueles que pretendem dedicar-se ao serviço dos povos em vias de desenvolvimento, se formem adequadamente em institutos idóneos»
(Concílio Ecuménico Vaticano II, Constituição Pastoral Gaudium et Spes, n. 88).
O que nos une são os bens que se dividem e a renúncia por amor - nasce, então, um alento “católico”, universal, o sentido de pertencer não a uma sociedade esclerosada, mas a um organismo sadio no qual todas as partes reagem a qualquer desequilíbrio.
2008-10-13
António Samelo
Aqui ficam.
LER A BÍBLIA EM “LECTIO DIVINA” (= “LIÇÃO DIVINA”)
A “lectio divina”, mais do que um método de leitura, é uma forma de entrar em diálogo com a Palavra de Deus ou Bíblia. No encontro com a Bíblia acontece o mesmo que no encontro com as pessoas: só entrando no pensamento do outro se conhece a verdade. O encontro entre as pessoas supõe uma entrega mútua, um profundo diálogo existencial que se funda no acolhimento e no amor. Do mesmo modo, o encontro com a Palavra de Deus não é pleno se não se entrar neste clima de mútua entrega, de acolhimento, de amor, pois quando nos aproximamos da Bíblia não nos aproximamos de palavras vazias, mas d’Aquele que nos fala através da Sua Palavra.A “lectio divina” supõe, pois, um encontro com Deus que nos fala através da Sua Palavra; um diálogo em que pouco a pouco vamos conhecendo o mistério de Cristo (São Jerónimo dizia: «desconhecer as Escrituras é desconhecer Cristo») e o coração de Deus (São Gregório Magno exortava: «conhece o coração de Deus através da Palavra de Deus»).
O itinerário da “lectio divina” tem quatro etapas:
1ª – LEITURA: é o ponto de partida e deve fazer-se com respeito. Consiste em ler e reler o texto, identificando os personagens e a acção, perguntando-se pelo contexto e pelos destinatários. Devem ter-se em conta os factores históricos (em que época se situa a acção? qual era a situação dos destinatários?), os literários (que recursos literários utiliza o autor? trata-se de um relato, de um poema, de um código legal...?) e teológicos [que experiência de fé transmite? que nos diz acerca de Deus, da(s) cultura(s), da história, de nós mesmos?]. É muito importante aproximar-se do texto sem preconceitos e sem projectar a nossa subjectividade. A pergunta que devemos fazer-nos nesta primeira etapa do itinerário é esta: o que é que, no seu contexto, o texto diz?
2ª – MEDITAÇÃO: a meditação consiste em absorver o texto até descobrir a mensagem que ele tem para nós. Na meditação há um diálogo entre o que Deus nos diz com a Sua Palavra e a nossa vida. A mensagem do texto ganha, deste modo, actualidade e converte-se numa mensagem para mim (nós). A meditação supõe um esforço de reflexão que põe em acção a nossa inteligência. A pergunta não é já: o que é que diz o texto no seu contexto, mas sim: o que é que o texto me (nos) diz na minha (nossa) situação?
3ª – ORAÇÃO: a leitura e meditação do texto conduzem-nos à oração. Com ela se inicia a terceira parte do diálogo. Até agora tentámos escutar Deus que nos fala pela Sua Palavra, mas esta escuta leva-nos ao encontro d’Aquele cuja Palavra escutámos. Na oração entra em jogo o coração e os sentimentos. É uma resposta muito nossa, que se exprime na súplica, no louvor, na acção de graças, no queixume... A pergunta aqui é: o que é que o texto me pede que diga a Deus?
4ª – CONTEMPLAÇÃO: é a etapa final de todo este caminho. Nela se transcende a multiplicidade de sentimentos e reflexões, para centrar a atenção no mistério de Jesus, o Filho de Deus; um mistério de que falam todas as páginas da Escritura e, dum modo especial, o Novo Testamento. Este encontro profundo proporciona um novo olhar sobre Deus, sobre a pessoa humana e sobre a(s) cultura(s) e revela o desígnio e a vontade de Deus. A contemplação não supõe, de nenhuma maneira, uma evasão da realidade, mas o entrar mais profundamente na história e no desígnio de Deus, levando-nos ao compromisso e à acção para tornar presente na(s) cultura(s) esse desígnio salvador: quem contempla transforma-se no contemplado: Cristo Jesus, a Palavra feita carne (cf Gl 2, 20).
(in: LA CASA DE LA BIBLIA, Curso de iniciação à leitura da Bíblia, Gráfica de Coimbra - Difusora Bíblica, Coimbra, 1996. p. 29)
28º DOMINGO DO TEMPO COMUM - Ano A
12 de Outubro de 2008
12 de Outubro de 2008
Is 25, 6-10a; Fl 4, 12-14.19-20; Mt 22, 1-14
Comentário:
«Os cristãos hão-de cooperar de bom grado e de todo o coração na construção da ordem internacional, com respeito sincero pelas legítimas liberdades e na amiga fraternidade de todos, e isto tanto mais quanto a maior parte do globo sofre ainda de tanta pobreza que o próprio Cristo, na pessoa dos pobres, apela em alta voz para a caridade dos seus discípulos. Não se dê, pois, aos homens o escândalo que consiste no facto de algumas nações, das quais muitas vezes a maioria dos habitantes se diz cristã, gozarem de abundância de bens, enquanto outras estão privadas dos bens mais necessários para vida e são atormentadas pela fome, pelas doenças e por toda espécie de miséria. O espírito de pobreza e de caridade são, com efeito, a glória e o sinal da Igreja de Cristo.
Devem, portanto, ser louvados e ajudados aqueles cristãos, sobretudo jovens, que se oferecem espontaneamente para prestar auxílio a outros homens e povos. Além disso, é dever de todo o Povo de Deus, precedido pelo exemplo e pela palavra dos Bispos, aliviar, na medida das suas forças, as misérias deste tempo, e isto, como era costume antigo da Igreja, não só com o supérfluo, mas também com o necessário.
Embora o modo de reunir e distribuir os auxílios não seja organizado de forma rígida e uniforme, deve contudo obedecer a uma recta ordem nas dioceses, nos países e em todo o mundo, e onde parecer oportuno, conjugando a acção dos católicos com a dos outros irmãos cristãos. Com efeito, o espírito de caridade, muito longe de se opor ao exercício prudente e ordenado da acção social e caritativa, antes o impõe. Por isso, é necessário que aqueles que pretendem dedicar-se ao serviço dos povos em vias de desenvolvimento, se formem adequadamente em institutos idóneos»
(Concílio Ecuménico Vaticano II, Constituição Pastoral Gaudium et Spes, n. 88).
O que nos une são os bens que se dividem e a renúncia por amor - nasce, então, um alento “católico”, universal, o sentido de pertencer não a uma sociedade esclerosada, mas a um organismo sadio no qual todas as partes reagem a qualquer desequilíbrio.
2008-10-13
António Samelo
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