2º Domingo da Quaresma - Ano C
À Mesa da Palavra levámos um texto de Maria de Lourdes Pintasilgo, tão actual nos desafios que nos lança...
«A grande empresa não é o plano pensado e repensado, a estrutura gigantesca que, com os seus tentáculos, tudo vai abafar, nem a mentalidade renovada, adaptada, ajustada, conformada. A grande empresa é mudar a vida.
Mudar estruturas mudando-nos. Mudar o olhar que pomos nas coisas e com ele fazer nascer novas possibilidades de relação, de acção, de organização. (...)
Pois que caiam as estruturas, e se pudermos ajudar a desmantelá-las teremos ajudado a que a vida cresça; mas que elas caiam por obsoletas, porque em seu lugar, no espaço aberto que é o mundo da criação, já o nosso pensamento e as nossas mãos criaram, estruturando-a, a verdade do hoje que melhor serve os homens e que melhor torna visível o movimento de Deus na História.
Pois que mudem as mentalidades; mas não por mimetismo simiesco de qualquer última moda, antes porque o horizonte novo, ao revelar novos vales e montanhas, nos situa diferentemente, nos sugere novas imagens, nos obriga a uma síntese, nos dá um impulso para uma nova maneira de ser e de estar. (...)
Mudar a vida é esboçar em cada momento os novos valores e suscitar as condi¬ções de experiência que os tornam reais; é captar na experiência a que a história nos conduz os valores insuspeitados, desconhecidos ou ignorados. (...)
A única via pela qual horizontes novos se podem rasgar [é] aquela em que esco¬lhemos percorrer o próprio trilho da mudança. E quando digo que escolhemos percorrer este trilho, não estou a imaginar um caminho linearmente percorrido sem perigos nem desvios. Pelo contrário, no caminho da mudança, seremos ossos encharcados debaixo da chuva, seremos gestos descontrolados nas areias movediças, seremos passos indecisos a contornar rochas de granito.»
“AVISTAR A TERRA JÁ É ALEGRIA…”
À Mesa da Palavra levámos um texto de Maria de Lourdes Pintasilgo, tão actual nos desafios que nos lança...
A grande empresa é mudar a vida
«A grande empresa não é o plano pensado e repensado, a estrutura gigantesca que, com os seus tentáculos, tudo vai abafar, nem a mentalidade renovada, adaptada, ajustada, conformada. A grande empresa é mudar a vida.
Mudar estruturas mudando-nos. Mudar o olhar que pomos nas coisas e com ele fazer nascer novas possibilidades de relação, de acção, de organização. (...)
Pois que caiam as estruturas, e se pudermos ajudar a desmantelá-las teremos ajudado a que a vida cresça; mas que elas caiam por obsoletas, porque em seu lugar, no espaço aberto que é o mundo da criação, já o nosso pensamento e as nossas mãos criaram, estruturando-a, a verdade do hoje que melhor serve os homens e que melhor torna visível o movimento de Deus na História.
Pois que mudem as mentalidades; mas não por mimetismo simiesco de qualquer última moda, antes porque o horizonte novo, ao revelar novos vales e montanhas, nos situa diferentemente, nos sugere novas imagens, nos obriga a uma síntese, nos dá um impulso para uma nova maneira de ser e de estar. (...)
Mudar a vida é esboçar em cada momento os novos valores e suscitar as condi¬ções de experiência que os tornam reais; é captar na experiência a que a história nos conduz os valores insuspeitados, desconhecidos ou ignorados. (...)
A única via pela qual horizontes novos se podem rasgar [é] aquela em que esco¬lhemos percorrer o próprio trilho da mudança. E quando digo que escolhemos percorrer este trilho, não estou a imaginar um caminho linearmente percorrido sem perigos nem desvios. Pelo contrário, no caminho da mudança, seremos ossos encharcados debaixo da chuva, seremos gestos descontrolados nas areias movediças, seremos passos indecisos a contornar rochas de granito.»
Maria de Lourdes Pintassilgo, "A única mudança real" [Janeiro 1978], in Dimensões da Mudança, prefácio de Eduardo Prado Coelho, Porto, Edições Afrontamento, 1985, pp. 17-19 (adaptado)
Continuámos, depois, com a reflexão proposta pelo Samelo para este Domingo.
A fé de Abraão e a transfiguração de Jesus“AVISTAR A TERRA JÁ É ALEGRIA…”
O Deus de Jesus é o melhor “aliado” da pessoa humana, pois é o Deus da aliança, o Deus que entra em contacto connosco, o Deus que nos trata por “tu” e a quem podemos tratar por “tu” - e é na Bíblia que encontramos esse Deus “diferente”: as suas promessas são sempre totalmente gratuitas; mesmo que a pessoa humana peque, Ele não rompe a Sua amizade; permanece fiel; o Seu amor é sempre mais forte que qualquer das nossas traições e, não obstante as nossas escolhas erradas, caminha sempre connosco - “TU NÃO NOS QUISESTE ABANDONAR…”
Assim, os cristãos nem são narcisistas nem são masoquistas!...
pois como Abraão confiam incondicionalmente no Deus da aliança - aliança que é o novo sentido da história pessoal de Abraão e do povo que dele nascerá como sinal da fidelidade de Deus: toda a aliança supõe uma saída e uma entrada; um êxodo do Egipto e um ingresso na terra prometida; ou, segundo os profetas, um êxodo do pecado, da injustiça social, do formalismo cultual, para um ingresso no reino messiânico de paz e de fidelidade - e
subindo à montanha (celebrando e orando), não só “escutam” o que Jesus, a Palavra feita carne, lhes diz na sua situação e o que lhes pede para dizer ao Pai, como também O contemplam transfigurado (ressuscitado), transfigurando-se também;
uma vez transfigurados (após terem descoberto na celebração e na oração o caminho a percorrer), põem-se a caminho com Jesus que sobe para Jerusalém para doar a própria vida - descem a montanha (saem do momento celebrativo) para prosseguir a sua caminhada como agentes de transfiguração na “cidade” ao “jeito de Jesus” (ao “jeito do sermão da montanha”) (cf Mt 5─7):
“A prioridade reconhecida à liberdade e à conversão do coração não elimina, de forma alguma, a necessidade de mudança das estruturas injustas. É plenamente legítimo que aqueles que sofrem opressão por parte dos detentores da riqueza ou do poder político reajam, por meios moralmente lícitos, a fim de obter estruturas e instituições nas quais os seus direitos sejam verdadeiramente respeitados.”
(CONGREGAÇÃO PARA A DOUTRINA DA FÉ, Instrução sobre a liberdade cristã e a libertação de 22 de Março de 1986 nº 75)
UM TESTEMUNHO
(cf MORGADO Lopes, Lucas e paz na terra!, Difusora Bíblica, Lisboa, 1988, p. 90)
“Para um povo baptizado que reconhece em Cristo Salvador a sua salvação, que transfiguração solicita a Palavra de Deus em favor da maioria dos camponeses, explorados por uma minoria que retém riquezas, poder de decisão, controle da imprensa?... Muitos baptizados ainda não assimilaram os postulados do Evangelho e, por isso, não estão ainda ‘transfigurados’; a sua mente e o seu coração contrapõem ainda uma barreira de egoísmo à mensagem de Jesus Salvador.”
(Padre Rutílio GRANDE, homilia na festa nacional da Transfiguração, na catedral de El Salvador, com a presença do Governo)
Padre RUTÍLIO GRANDE GARCIA (1928-1977)
Nascido em El Paisnal (EI Salvador), o padre Rutílio entrou para os Jesuítas aos 17 anos e fez os estudos teológicos em Espanha, onde foi ordenado presbítero em 1959, regressando ao seu país em 1963. Nesse mesmo ano tinha sido fundado pelos grandes agrários o Partido da Conciliação Nacional, para manterem a situação permitida pelo regime militar no poder desde 1932: que 60% das terras estivesse nas mãos de uma oligarquia de 40 famílias, correspondentes a 20 % da população, enquanto o resto do país vivia em extrema pobreza. O padre Rutílio trabalhava entre os camponeses, promovendo a sua tomada de consciência da situação à luz da Palavra de Deus. Vendo o desagrado do poder pela sua homilia na festa da Transfiguração, exilou-se voluntariamente no Equador. Mas, tal como Moisés, depressa voltou para o meio dos seus compatriotas pobres. Em 1971 foi nomeado pároco de Aquilares, onde se instalou com uma equipa de colegas, adoptando o método de ler e estudar a Palavra de Deus em grupo. Seu objectivo: “Pequenas comunidades vivas de homens novos, conscientes da própria vocação humana, capazes de se tornarem protagonistas do seu próprio destino individual e social, alavancas de transformação.” Em três anos, o objectivo foi conseguido. A formação cristã foi também integrada por cursos de alfabetização e de cooperativismo. A partir daí, algumas organizações de trabalhadores da terra foram revitalizadas por esses cristãos e espalharam-se por todo o país. O poder económico ergueu-se em força contra a obra “marxista” dos padres “terceiro-mundistas”... Resposta do padre Rutílio: “Aquilo que preocupa estes assim chamados católicos conservadores é o “deus dinheiro”, um deus construído pelas mãos do homem, amassado com o sangue dos irmãos inocentes... Eu amo-os e as acusações gratuitas a nosso respeito não têm fundamento. Estou disposto a dar a vida...”. O padre Bernal, colega da equipa do padre Rutílio, é expulso do país. O padre Rutílio repete a mesma denúncia, a 13 de Fevereiro de 1977, sublinhando: “A Eucaristia que estamos a celebrar alimenta este nosso ideal de uma mesa comum para todos, com um lugar para cada um e Cristo no meio”. A 12 de Março seguinte, quando se dirigia para a sua terra natal com outros cristãos para preparar uma festa religiosa, foi morto por uma rajada de metralhadora. Dom Óscar Romero (arcebispo de São Salvador desde Fevereiro de 1977 até Março de 1980, data em foi assassinado durante uma Eucaristia a que presidia no 1º aniversário da morte da mãe de um jornalista) diria que foi o exemplo do padre Rutílio e a sua morte que o convenceram a pôr-se decididamente ao lado dos pobres de El Salvador.
1. Se me envolve a noite escura
E caminho sobre abismos de amargura,
- Nada temo, porque a LUZ está comigo. (bis)
2. Se me colhe a tempestade
E o mar vai engolir a minha barca,
- Nada temo, porque a PAZ está comigo. (bis)
3. Se me perco no deserto
E de sede me consumo e desfaleço,
- Nada temo, porque a FONTE está comigo. (bis)
4. Se os amigos me deixarem
Em caminhos de miséria e orfandade,
- Nada temo, porque o PAI está comigo. (bis)
5. Se mais nada me restar
E no mundo só achar desilusões,
- Nada temo, porque o CÉU está comigo. (bis)
António Samelo
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