terça-feira, janeiro 8

Epifania

Por sugestão do José Carlos Pina, publico a reflexão/homilía do Pe. João Resina (texto recolhido aqui), que nos pareceu muito alinhada com a reflexão que nos foi proposta pela Equipa de Liturgia no passado Domingo.

EPIFANIA DO SENHOR

O tempo do Natal começa com a celebração do nascimento de Jesus e termina com a celebração da Epifania. É difícil averiguar se os evangelistas contam simplesmente dois conjuntos de factos ocorridos ou estão já a interpretar a vinda de Jesus, socorrendo-se de imagens de grande poder e beleza. S. Lucas, que irá sublinhar o amor de Jesus para com os pobres, conta que o Filho de Deus nasceu num presépio e aí foi visitado por um grupo de pastores – homens ignorantes e sem poder, despertados por um anjo. S. Mateus narra que, tempos depois, Ele recebe a visita de um grupo de magos, homens sábios e ricos, há muito esperançados no Messias, vindos de longes terras. Em suma, é-nos dito que este Menino nasceu para os ricos e para os pobres, para os ignorantes e para os sábios, para aqueles que há muito O procuravam e para aqueles que se limitaram a abrir o coração ao seu apelo. Veio contactar com todos os homens, veio manifestar a todos o amor de Deus (“epifania” significa manifestação).

Hoje, a Epifania está-nos entregue. É a nós, cristãos, que cabe manifestar Jesus Cristo aos homens do nosso tempo.

Os primeiros cristãos anunciavam com alegria e simplicidade a Boa Nova em que tinham acreditado e transformara as suas vidas: a entrada de Jesus no mundo, a sua pregação, a morte e a ressurreição, o Reino que ia crescer. Vieram logo a seguir apologistas e teólogos, que começaram a sistematizar a doutrina, a resolver dificuldades. Mas uma coisa se tornou clara desde então: o anúncio fundamental de Jesus Cristo podia ser feito por cristãos muito ignorantes; os refinamentos teológicos tinham o seu lugar, mas um lugar secundário. A grande força dos cristãos não estava no seu “saber”, estava na sua identificação com Jesus Cristo, no seu amor sem condições nem fronteiras. Em breve vieram as perseguições: “o sangue dos mártires foi semente de cristãos”.

Veio depois o tempo em que os cristãos puderam enriquecer e mandar. Imaginaram – como os judeus do Antigo Testamento – que uma Igreja rica e poderosa, com um cerimonial esplêndido, seria para os homens uma manifestação de Deus. Quiseram tutelar a cultura, pretenderam que toda a verdade, nomeadamente a da ciência, tinha de ser passada ao crivo da sua doutrina. Duvido de que este projecto tenha tido alguma vez eficácia. Mas de uma coisa estou certo, hoje é um contra-sinal, uma contra - manifestação de Jesus Cristo.

Certamente que os cristãos têm de estar presentes em todas as actividades honestas da terra. Não têm de ensinar a doutrina cristã a respeito da agricultura, da medicina, da engenharia, da economia ou da sexualidade pela razão simples de que não existe tal doutrina. O que existe é o mandamento novo de viver tudo o que pertença à condição humana na maior generosidade, no dom maior. E é esse testemunho que os cristãos devem dar. Individualmente e em conjunto. A Igreja tem de pregar sem medo e sem peias. A Igreja tem de ser uma presença forte e fiel, mas humilde e sem poder. Não pode ter a ilusão de que sabe ensinar coisas que Jesus não ensinou.

As estatísticas mostram que de ano para ano são menos as pessoas que vêm às nossas celebrações, casam na Igreja, mandam os filhos à catequese. Será que nós, em vez de manifestar Cristo, O ocultamos? Será que as nossas homilias, as nossas devoções, os nossos catecismos, ignoram cada vez mais as bem-aventuranças e a cruz e se fixam em coisas secundárias, teologias marginais, formas que irritam a sensibilidade do nosso tempo?

Uma questão importante é da linguagem. Deixemos de falar “igrejês”, seja o nosso falar como a linguagem directa do Senhor.

6 de Janeiro de 2008 - Pe. João Resina Rodrigues

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