sábado, janeiro 5

Domingo da Epifania do Senhor – 6 de Janeiro de 2008

Bom ano a todas e a todos!

Por sugestão do Zé Pureza, deixo aqui, para quem quiser, o texto do Anselmo Borges publicado hoje no Diário de Notícias.

Como já fomos avisados, cantaremos as Janeiras, na Boleta (em casa da Fátima e do Jorge Oliveira), em Dia de Reis. Encontramo-nos lá às 17.30 (ver mapa).



Celebraremos, também, a Epifania. Para podermos preparar a nossa Celebração, o Samelo enviou-nos o texto que a seguir se transcreve (quem quiser poderá fazer o download aqui)...


EPIFANIA
(Do grego = manifestação)

Festa do Senhor, com a categoria de solenidade, que, no calendário geral da Igreja, se celebra no dia 6 de Janeiro (ou, onde não for feriado, como entre nós, no domingo entre 2 e 8 de Janeiro), em comemoração da manifestação de Jesus Menino aos Magos do Oriente, primícias da gentilidade que Ele vinha integrar no povo de Deus (cf. Mt 2, 1-12). O povo dá-lhe o nome de “Festa dos Reis (Magos)”, e a tradição dá a estes os nomes de Gaspar, Belchior e Baltazar, que ofereceram ao Menino ouro (por ser rei), incenso (por ser Deus) e mirra (por ser homem sujeito à morte) - eram sábios medas, persas e caldeus. O episódio da Epifania narrado em Mt 2, 1-12 é interpretado como empolamento intencional de um acontecimento histórico (midrash = midrash bíblica é a elaboração bastante livre de textos anteriores ou de tradições orais, com finalidades teológicas ou de edificação; desta maneira são tratados temas dos livros de Samuel e dos Reis pelos livros das Crónicas; temas do êxodo e das pragas do Egipto pelo livro da Sabedoria; etc.) para anunciar que a salvação de Jesus Cristo também abrangia os gentios. Nada se sabe ao certo do número e nome dos Magos. Nas mais antigas representações aparecem com mitras e mais tarde coroados como reis, talvez com base em Sl 72(71), 10 e Is 60, 6. O número de três terá sido influenciado pelos três presentes oferecidos (ouro, incenso e mirra). Os nomes de Melchior, Baltasar e Gaspar (este negro) surgem no séc. VIII, e Beda, Venerável, (672-735) considera-os representantes da Europa, Ásia e África.
A Epifania é das festas mais antigas (séc. IV), que teve origem na África, mais precisamente no Egipto, e era uma festa pagã em que se celebrava a vitória da luz sobre as trevas - a liturgia cristã tomou este tema e propõe-no hoje à nossa reflexão na primeira leitura e no Evangelho: Jesus é apresentado como a luz que atrai a Si todos os povos.
A Epifania é celebrada tanto no Oriente como no Ocidente, embora o objecto principal desta festa, nas Igrejas do Oriente, seja o Baptismo do Senhor que, entre nós, se celebra como solenidade normalmente no domingo que encerra o ciclo do Natal. Nos textos litúrgicos da Epifania, entre nós, há referência a mais duas epifanias, a do Baptismo do Senhor (teofania, pois se manifestaram também o Pai e o Espírito Santo, cf. Mt 3,13-17) e a do primeiro dos “sinais”, nas Bodas de Caná (para consolidar a fé inicial dos primeiros discípulos, cf. Jo 2,1-11).


JESUS, ESTRELA QUE GUIA TODOS OS POVOS

1ª LEITURA - IS 60, 1-6
Levanta-te e resplandece, Jerusalém, porque chegou a tua luz e brilha sobre ti a glória do Senhor. Vê como a noite cobre a terra, e a escuridão os povos. Mas sobre ti levanta-Se o Senhor, e a sua glória te ilumina. As nações caminharão à tua luz, e os reis ao esplendor da tua aurora. Olha ao redor e vê: todos se reúnem e vêm ao teu encontro; os teus filhos vão chegar de longe, e as tuas filhas são trazidas nos braços. Quando o vires ficarás radiante, palpitará e dilatar-se-á o teu coração, pois a ti afluirão os tesouros do mar, a ti virão ter as riquezas das nações. Invadir-te-á uma multidão de camelos, de dromedários de Madiã e Efá. Virão todos os de Sabá, trazendo ouro e incenso e proclamando as glórias do Senhor.

EVANGELHO - Mt 2,1-12
Tinha Jesus nascido em Belém da Judeia, nos dias do rei Herodes, quando chegaram a Jerusalém uns Magos vindos do Oriente.
«Onde está – perguntaram eles – o rei dos judeus que acaba de nascer? Nós vimos a sua estrela no Oriente e viemos adorá-l’O».
Ao ouvir tal notícia, o rei Herodes ficou perturbado e, com ele, toda a cidade de Jerusalém. Reuniu todos os príncipes dos sacerdotes e escribas do povo e perguntou-lhes onde devia nascer o Messias. Eles responderam:
«Em Belém da Judeia, porque assim está escrito pelo Profeta: ‘Tu, Belém, terra de Judá, não és de modo nenhum a menor entre as principais cidades de Judá, pois de ti sairá um chefe, que será o Pastor de Israel, meu povo’».
Então Herodes mandou chamar secretamente os Magos e pediu-lhes informações precisas sobre o tempo em que lhes tinha aparecido a estrela. Depois enviou-os a Belém e disse-lhes:
«Ide informar-vos cuidadosamente acerca do Menino; e, quando O encontrardes, avisai-me, para que também eu vá adorá-l’O».
Ouvido o rei, puseram-se a caminho. E eis que a estrela que tinham visto no Oriente seguia à sua frente e parou sobre o lugar onde estava o Menino. Ao ver a estrela, sentiram grande alegria. Entraram na casa, viram o Menino com Maria, sua Mãe, e, prostrando-se diante d’Ele, adoraram-n’O. Depois, abrindo os seus tesouros, ofereceram-Lhe presentes: ouro, incenso e mirra. E, avisados em sonhos para não voltarem à presença de Herodes, regressaram à sua terra por outro caminho.

* * *
O episódio da visita dos “magos” ao Menino de Belém é um episódio simpático e terno que, ao longo dos séculos, tem provocado um impacto considerável nos sonhos e nas fantasias dos cristãos… No entanto, convém recordar que estamos, ainda, no âmbito do “Evangelho da Infância”; e que os factos narrados nesta secção não são a descrição exacta de acontecimentos históricos, mas uma catequese sobre Jesus e a sua missão… Por outras palavras: Mateus não está, aqui, interessado em apresentar uma reportagem jornalística que conte a visita oficial de três chefes de estado estrangeiros à gruta de Belém; mas está interessado em (recorrendo a símbolos e imagens bem expressivos para os primeiros cristãos) apresentar Jesus como o enviado de Deus Pai, que vem oferecer a salvação de Deus aos homens de toda a terra.

Os “magos” têm gozado sempre de muita popularidade. Basta pensar que, 150 anos logo depois do nascimento de Jesus, nos cemitérios cristãos começa a ser reproduzida a sua imagem.
Os cristãos, porém, não se contentaram com as poucas notícias fornecidas pelo texto evangélico. Faltam muitos pormenores: De onde eram provenientes? Quantos eram? Como se chamavam? Que meio de transporte usaram? O que fizeram depois de terem regressado aos seus países? Onde foram sepultados?
Para responder a estes perguntas, surgiram, desde tempos antigos, muitas histórias. Diz-se que eram reis, que eram três, que vinham um da Africa, outro da Ásia e um da Europa e que um era negro, um amarelo e outro branco. Guiados pela estrela, tinham-se encontrado num mesmo ponto e depois tinham percorrido juntos a última etapa do caminho até Belém. Diz-se que se chamavam Gaspar, Melchior e Baltazar; que, para a viagem, se serviram de camelos e dromedários; que, depois de terem regressado a casa, quando já tinham a veneranda idade de 120 anos, um dia voltaram a ver a estrela, partiram e encontraram--se de novo numa cidade da Anatólia, para celebrar a Missa de Natal; e que, no mesmo dia, morreram contentes; que as suas relíquias deram a volta ao mundo e agora repousam na Catedral de Colónia na Alemanha.

Ora bem, trata-se de histórias. Voltemos agora ao texto evangélico e procuremos colher a mensagem que Mateus quer comunicar. Para a podermos compreender, é preciso esclarecer primeiro algumas coisas. A análise dos vários detalhes do relato confirma que a preocupação de Mateus não é de tipo histórico, mas catequético.

Antes de mais, os “magos” não eram reis. Deviam pertencer ao grupo de pessoas muito conhecidas na antiguidade, peritas em interpretar os sonhos, prever o futuro, olhando para o curso dos astros e observando o voo dos pássaros; pessoas que sabiam ler a vontade de Deus através dos acontecimentos ordinários e extraordinários da vida. Não admira, pois, que se diga que os “magos” conseguiram descobrir, no aparecimento duma estrela, uma mensagem do céu. A palavra grega “mágos” usada por Mateus abarca um vasto leque de significados e é aplicada a personagens muito diversas: mágicos, feiticeiros, charlatães, sacerdotes persas, propagandistas religiosos… Aqui, poderia designar astrólogos mesopotâmios, em contacto com o messianismo judaico. Seja como for, esses “magos” representam, na catequese de Mateus, esses povos estrangeiros de que fala a primeira leitura (cf. Is 60, 1-6), que se põem a caminho de Jerusalém com as suas riquezas (ouro e incenso) para encontrar a luz salvadora de Deus que brilha sobre a cidade santa. Jesus é, na opinião de Mateus e da catequese da Igreja primitiva, essa “luz”.

Em relação à estrela, na antiguidade, julgava-se que, quando nascia uma pessoa destinada a uma grande missão, aparecia uma estrela no céu.
Os “magos” terão visto realmente um cometa? A interpretação desta referência como histórica levou alguém a cálculos astronómicos complicados para concluir que, no ano 6 a.C., uma conjunção de planetas explicaria o fenómeno luminoso da estrela refulgente mencionada por Mateus; outros andaram à procura de um cometa que, por esta época, devia ter sulcado os céus do antigo Médio Oriente… Bem poderiam ter aproveitado melhor o tempo, porque a estrela que os Magos viram não era um astro material, mas a estrela de que fala a Escritura. Na realidade, é inútil procurar nos céus a estrela ou cometa em causa, pois Mateus não está a narrar factos históricos. Segundo a crença popular da época, o nascimento de um personagem importante era acompanhado da aparição de uma nova estrela. Também a tradição judaica anunciava o Messias como a estrela que surge de Jacob (cf. Nm 24, 17). Ora, é com estes elementos que a imaginação de Mateus, posta ao serviço da catequese, vai inventar a “estrela”. Mateus está, sobretudo, interessado em fornecer aos cristãos da sua comunidade argumentos seguros para rebater aqueles que negavam que Jesus era esse Messias esperado.
Se lermos os capítulos 22-24 do livro dos Números, encontramos a curiosa história de Balaão e da sua «jumenta faladora». Balaão era um adivinho, um mago do Oriente, precisamente como os referidos pelo Evangelho de hoje. Um dia, sem querer, ele fez uma profecia importante, dizendo: «Vejo-o, mas não agora; contemplo-o, mas não está próximo: uma estrela sai de Jacob e um ceptro flamejante surge do seio de Israel... Sim, de Jacob nascerá um dominador» (Nm 24, 17.19).
Assim falava, cerca de 1200 anos antes do nascimento de Jesus, Balaão, «o homem de olhos penetrantes» (Nm 24, 3). Desde então, os israelitas começaram a esperar com ânsia o aparecimento dessa estrela que não era senão o Messias.
Estas ideias eram muito familiares a Mateus e aos seus leitores. Apresentando-nos os “magos” do Oriente que vêem a estrela, o evangelista quer dizer-nos que finalmente chegou o esperado libertador da estirpe de Jacob: é aquele Jesus que os “magos” reconheceram e adoraram. É Ele a estrela.
Procuremos agora relacionar o Evangelho de hoje com a primeira leitura. O profeta dizia que, quando brilhasse em Jerusalém a luz do Senhor, todos os povos se poriam a caminho rumo a esta cidade santa, levando os seus dons. Mateus vê no episódio dos “magos” a realização desta profecia: guiados pela luz do Messias, os povos pagãos (representados pelos “magos”) dirigem-se para Jerusalém, para levar os seus dons: ouro, incenso e mirra.
Também a história das montadas não foi inventada a partir do nada. É ainda a primeira leitura de hoje que nos fala de «uma multidão de camelos e dromedários que vêm do Oriente» (Is 60, 6).
Mas então devemos tirar dos nossos presépios e retirar da lista das nossas imagens a estrela? Não! Contemplemos à vontade essa estrela e mostremo-la também às nossas crianças, mas digamos-lhes que a estrela não é um astro do céu, mas Jesus: é Ele a luz que ilumina todos os homens.
Os “magos” representam as pessoas de todo o mundo que se deixam guiar pela mensagem de paz e amor de Cristo. Eles são a imagem da Igreja, composta por gente de todas as raças, tribos, línguas e nações. Entrar para a Igreja não significa renunciar à própria identidade, não quer dizer submeter-se a uma injusta e falsa uniformidade. Cada pessoa e cada povo mantêm as suas características culturais. Melhor, essas características contribuem para enriquecer a Igreja universal. Ninguém é tão rico que não precise de nada e também ninguém é tão pobre que não tenha nada para dar.

ACTUALIZAÇÃO
Hoje, como no tempo de Jesus, diante da estrela, as pessoas assumem atitudes diferentes. Há quem como os “magos”, se ajoelhe (v. 11), ou seja, reconheça n’Ele a luz do mundo e se Lhe submeta; há quem fique indiferente; e há finalmente quem procure apagar essa luz. Todos viram a mesma realidade: um menino acabado de nascer. Mas as escolhas foram e são diversas. Quem é capaz de O reconhecer? Os que se deixam iluminar pela Escritura que nos fala d’Ele.

* Os “magos” são apresentados como os “homens dos sinais”, que sabem ver na “estrela” o sinal da chegada da libertação… Somos pessoas atentas aos “sinais” - isto é, somos capazes de ler os acontecimentos da nossa história e da nossa vida à luz de Deus? Procuramos perceber nos “sinais” que aparecem no nosso caminho a vontade de Deus? «Nenhuma ambição terrena move a Igreja; ela tem em vista um só fim: continuar, sob o impulso do Espírito Paráclito, a obra do próprio Cristo, que veio ao mundo para dar testemunho da verdade (cf. Jo 18, 37), para salvar e não para condenar, para servir e não para ser servido (cf. Jo 3, 17; Mt 20, 28; Mc10, 45).
Para cumprir tal missão, a Igreja tem o dever de perscrutar incessantemente os sinais dos tempos e de os interpretar à luz do Evangelho, de tal sorte que possa responder, de um modo adequado a cada geração, às perenes interrogações dos homens sobre o sentido da vida presente e futura e sobre a sua relação recíproca. Importa, por conseguinte, conhecer e compreender este mundo no qual vivemos, as suas esperanças, as suas aspirações, a sua índole frequentemente dramática.» (CONCÍLIO ECUMÉNICO VATICANO II, Constituição pastoral Gaudium et Spes sobre a Igreja no mundo contemporâneo de 07-12-1965 (GS), nn. 3 e 4).

* Impressiona também, no relato de Mateus, a “desinstalação” dos “magos”: viram a “estrela”, deixaram tudo, arriscaram tudo e vieram procurar Jesus. Somos capazes da mesma atitude de desinstalação, ou estamos demasiado agarrados ao nosso sofá, ao nosso colchão especial, à nossa televisão, à nossa aparelhagem? Somos capazes de deixar tudo para responder aos apelos que Jesus nos faz através dos irmãos?
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[In: - ARMELLINI Fernando, Banquete da Palavra. Comentário às leituras dominicais - Ano C, Edições Paulinas, Lisboa, 1997, pp. 79-84 (adaptado).
- Comentário às Leituras da Solenidade da Epifania do Senhor - Ano A - 6 de Janeiro de 2008 por GRUPO DINAMIZADOR: P. Joaquim GARRIDO, P. Manuel BARBOSA, P. José Ornelas CARVALHO - Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos) scj.lu@netcabo.pt - www.ecclesia.pt/dehonianos (adaptado).
- FALCÃO Manuel Franco, Enciclopédia Católica Popular, Edições Paulinas, Lisboa, 2004, verbetes “Epifania”, “Magos do Oriente” e “midrash” (adaptado)].

2008-01-04
António Samelo

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