sexta-feira, abril 16

Transfiguração – 1º Domingo

Cântico de Entrada – Abre os meus olhos

Abre meus olhos meu Senhor
E verei o dia
Visitação do sol da luz
Que ilumina a vida
Guia-me pela mão
Sê a lâmpada dos meus pés
Que em tudo vacilam.

Guia os meus pés e as minhas mãos
Para a paz que façam.
Dá-me o teu nome e partirei
Dos lugares da sombra
Vem poder do Amor
Libertar o que nos falta ver
E que os olhos querem

Abram-se as portas do que é breu
Sobre os campos verdes
E floresçam mil flores
Onde a morte cresce
Vem Clamor da Manhã,
Vem gritar que um fogo arde em nós
E a promessa avança


Momento Penitencial
Carta a meus filhos sobre os Fuzilamentos de Goya, Jorge de Sena dito por Mário Viegas (Público [ed.], Mário Viegas - Discografia Completa: 5 – Pretextos para Dizer (1978), Lisboa, Público - Comunicação Social, SA, 2006)




Kyrie



Lourenço Ribeiro, missa pro defunctis – Coro Gulbenkain, dir. Jorge Matta

De seguida, comungámos a palavra do Evangelho; juntámos, a este momento, um texto de Erri de Luca (que nos vai acompanhar em todo o percurso):

"BABEL
Os homens gostam da construção civil. Erigiram muralhas colossais, templos sobre colunas, pirâmides, castelos, arranha-céus, pontes. A sagrada escritura conta a complexa e inspirada equipa reunida por Salomão para construir o templo em Jerusalém. Ainda antes deste, um empreendimento gigantesco e visionário foi concebido pela humanidade nos seus inícios, segundo a narração do capítulo 11 do livro Bereshìt / Génesis: um edifício que chegasse ao céu. Foi o mais grandioso projecto de todos os tempos, merecedor por este motivo do maior desastre. A humanidade não tinha outro desejo, outras ocupações: a escritura diz que usava palavras únicas, devarím ahadím. Estava concentrada numa única tarefa, como uma sociedade de abelhas, de formigas. Deus afastou-a desse beco sem saída: o céu não poderia ser alcançado com pedras e cal. Era uma multidão assustada a que se tinha reorganizado depois do dilúvio. Sonhava um lugar que nunca mais fosse submerso, uma altura que fundasse uma aliança com o céu, era esta a intenção da torre. Deus intervém com o dom misterioso das línguas que nos obriga a aprender muitos modos de nomear o mesmo sol, o mesmo pão. Teve em troca os alfabetos, as orações, os cantos.
E teve o vasto mundo para habitar, afastando-se assim da ilusão de um centro. Pela primeira vez a intenção de Deus é de espalhar a humanidade por toda a superfície da terra. Pela primeira vez se lê esta sua vontade: «e dali os espalhou Iod / Deus sobre a face de toda a terra» (Bereshìt / Génesis 11,9).
Juntamente com a multiplicação das línguas multiplicam-se os horizontes. Não haverá mais lugar da terra que permaneça sem uma pegada humana, sem uma tentativa de residência. Dos gelos habitados pelos esquimós a norte, como pelos povos da Terra do Fogo no sul, subindo os graus de latitude e de temperatura até aos desertos: a espécie humana move-se desde o vale de Scin’ar para multiplicar-se pelo planeta e tornar-se assim inextirpável. Nenhum dilúvio ou epidemia a extinguirá, porque em alguma parte resistirá.
Não era preciso subir ao céu para sobreviver, não necessitava de se entrincheirar, mas antes lançar-se à aventura do mundo. Aqui Deus ensina que a espécie humana é tanto mais forte quanto mais é variada e quanto mais é colocada à prova. Toda a tentativa de lhe dar um só sangue, um só pão, um só remédio vai na direcção errada. E também um só Deus: porque deve agradar-lhe a infinita variedade com que as criaturas, animais incluídos, o sentem próximo.

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