domingo, janeiro 25

"Senhor, eu creio mas aumenta a minha fé!"

A convite do José Pureza, a Ana Rita e o João Luís partilharam, hoje, connosco, a experiência de Oração que têm construído na vida deles e de cada um (ou vice-versa). Aqui fica o testemunho deles:

«Senhor, eu creio mas aumenta a minha fé!
Senhor, ensina-me a rezar!

Cara comunidade,
Desinstalaram-nos! E isso é bom.
De que nos vale ter uma experiência/vivência de fé se não a sabemos partilhar? Uma vez ouvimos um amigo dizer que a Bíblia era um conjunto de textos que relatavam as histórias da revelação de Deus aos Homens de várias épocas e sociedades, por isso, formavam um conjunto tão rico que merecia ser partilhado e rezado…
Saibamos nós, na nossa humildade literária, ir escrevendo mais umas páginas para juntar à história da revelação de Deus aos Homens por Ele amados. Porque fazemos parte da Sua criação e sabemos que esta “história nunca pode ser travada”.
Partimos de uma ideia base de que a oração é forma por excelência de estar em relação com Deus. Relação de amizade/amor em que existe um enorme bem-querer, como um Amigo próximo que conhecemos há muitos anos, que ora vai estando, mas que nem sempre está presente de uma forma visível. Contudo sabemos estar sempre disponível para nós e nós para ele. Ainda que não nos dediquemos como gostaríamos, quando algo de muito bom ou de menos bom acontece rapidamente nos lembramos Dele, agradecemos as conquistas ou partilhamos as tristezas.
Ana Rita e João Luís
25 de Janeiro de 2008

Deixo-vos para reflexão uma série de frases que fui escrevendo, porque encontro nelas alguma base para poder partilhar convosco a minha aprendizagem contínua e inacabada de oração. Não tenho por hábito escrever o que rezo, nem dedico horas a fio à oração como fiz nos exercícios espirituais de santo Inácio (donde retirei as frases que seguem).
Rezo no meio da confusão mas é no Silêncio, naquele que in ou felizmente não se encontra todos os dias, que melhor O reconheço. E são esses encontros, aqueles que realmente nos marcam, que me fazem ir rezando, num jeito desajeitado, só ou acompanhado, tal como vós!

Outubro de 2002
“Nem sempre é fácil ouvir-Te… Acho que ainda não conheço bem a tua voz (...) Mas queria e quero ouvir-Te… Procurei o espaço certo, a posição certa – difíceis de encontrar! Do quarto, para a capela (…) só senti frio e desconcentração… sentei-me no chão e nada, deitei-me na cama (e não sei se adormeci)
(…) acordei e cantei:

“Quem aguarda pelo noivo
A chama acesa mantém
Não se assusta com a demora
Pois sabe que o noivo vem”

“Obrigado pela coragem, por saber que é bom viver em Verdade (…) Se tem que ser, que seja agora!.. Se é um “jogo”, então que jogue com o baralho todo!”

Junho de 2008
“Confesso-me ainda com medo de por todas as cartas em cima da mesa… E se Deus me troca as voltas? (…) Onde fica a minha liberdade? Será uma simples escolha entre o bem e o mal? (...) Ou haverá um bem e um bem maior? Está escrito e acredito (…) “o vosso Pai sabe que tendes necessidades. Procurai, antes, o Seu Reino e o resto vos será dado por acréscimo”.

“Senhor gostava de te servir lá, mas sinto ser aqui onde agora mais me chamas a trabalhar… Obrigado pela paz e pela clareza destas linhas. Que o bem em mim por Ti criado, não estagne! Que continue a semear esperança ainda que veja o futuro qb mais incerto! Seja feita a Vossa vontade, porque ela é de amor e de bem!”

“Durante a adoração do Santíssimo foi difícil focar no central – Cristo ali mesmo à frente (…) e duvidava como poderia Ele estar ali. Levantei os olhos e fixei-me no Seu corpo por nós entregue (…) Ainda há muito mais por trabalhar (…) Mesmo com a casa meio desarrumada tenho gosto em Te receber…”

“Perante o túmulo vazio, o que Jesus amava acreditou que Jesus está vivo! E eu em que acredito? Tudo somado o que parece ter acontecido? Jesus aparece às pessoas, e deixa-se tocar (no caso de Tomé). Pedro e Paulo partem para Roma, eles que temeram e duvidaram.”

Dezembro de 2008
“Chegamos à parte difícil… ouvir o querer de Deus! Contudo quero acreditar e sei que a vontade de Deus é o melhor para mim e para a construção do Reino… Mas onde me coloco? Sair de mim!”

“Não busco a um Deus dos aflitos indecisos, seria reduzir a minha relação conTigo… Quero-Te presente na minha vida… nas relações que construo… no modo como as construo, as reparo, as renovo! (…)”

“Sei, mas ao certo não sei se sei… Sinto que cada vez que peco me afasto daquele que é o meu maior projecto de vida… Então é difícil recomeçar, aproximar… aumento a distância aos outros... e a Deus também!
Ajuda-me a perceber porque mesmo sabendo te viro as costas?
Obrigado por todos aqueles que pões no meu caminho e que me ajudam a perceber qual o caminho para Ti… Ensina-me a amar quem tanto me dá!”

“Nestes dias fui experimentando o ruído mais do que o silêncio profundo… Sei que as respostas do “Altíssimo” vêm a nós… Basta a nossa atenção, a capacidade para a acolher.”

“Deixa-me escrever a certeza que trago, para que nos momentos mais difíceis não desespere e compreenda que esta é a forma de ser + Humano. Obrigado Senhor por esta grande oportunidade que é Amar (...)”

domingo, janeiro 11

1º Domingo do Tempo Comum - 11 de Janeiro

O mundo celebrou, no dia 1 de Janeiro (em cada ano assim é...), o Dia Mundial da Paz!
Entretanto, começou a guerra em Gaza...



(as imagens foram retiradas, da Net, pelo Zé; a música, é de Jordi Savall [Fanfare de Jericho, 1200 av. J.C.], do seu recente trabalho Jérusalem: La Ville de deus Paix: La Paix céleste et la Paix terrestre. Umas e outra aqui reproduzimos com o devido respeito aos múltiplos autores.)


Rezámos por tudo isto, também com a ajuda dos poemas de Mahmud Darwish* (em traduções de Albano Martins para a Campo das Letras). Aqui ficam:


Bilhete de Identidade

Escreve!
Sou árabe
e o meu bilhete de identidade é o cinquenta mil;
tenho oito filhos
e o nono chegará no final do Verão.
Vais zangar-te?

Escreve!
Sou árabe.
Trabalho na pedreira
com os meus companheiros de infortúnio.
Arranco das rochas o pão,
as roupas e os livros
para os meus oito filhos.
Não mendigo caridade à tua porta,
nem me humilho nas tuas antecâmaras.
Vais zangar-te?

Escreve!
Sou árabe.
Sou um homem sem título.
Espero, paciente, num país
em que tudo o que há existe em raiva.
As minhas raízes,
foram enterradas antes do início dos tempos
antes da abertura das eras,
antes dos pinheiros e das oliveiras,
antes que tivesse nascido a erva.

O meu pai descende do arado,
e não de senhores poderosos.
O meu avô foi lavrador,
sem honras nem títulos,
e ensinou-me o orgulho do sol
antes de me ensinar a ler.
A minha casa é uma cabana,
feita de ramos e de canas.
Estás feliz com o meu estatuto?
Tenho um nome, não tenho título.

Escreve!
Sou árabe.
Roubaste os pomares dos meus antepassados
e a terra que eu cultivava com os meus filhos;
não me deixaste nada,
apenas estas rochas;
O governo vai tirar-me as rochas,
como me disseram?

Escreve, então,
no cimo da primeira página:
a ninguém odeio, a ninguém roubo.
Mas, se tiver fome,
devorarei a carne do usurpador.
Tem cuidado!
Cuidado com a minha fome,
Cuidado com a minha ira!


Os pássaros morrem na Galileia

Voltaremos a ver-nos em breve.
Dentro dum ano
ou dois
ou numa geração.
Em seguida ela guardou, precipitadamente, na sua máquina fotográfica
vinte jardins,
os pássaros da Galileia,
e partiu, para além dos mares, em busca
dum novo sentido para a verdade.
— A minha pátria é uma corda de estender roupa
para os lenços de sangue derramado
a cada momento.
E estendi-me na praia,
areia e... palmeiras.

Sobre isso, ela nada sabe.
— Rita! A morte e eu revelámos-te
o segredo da alegria murcha às portas das alfândegas.
A morte e eu renovámo-nos
na tua fronte primitiva
e na tua janela.

A morte e eu, duas faces.
Porque foges agora da minha?
Porquê?
Porque foges do que faz do trigo
os cílios da terra,
do vulcão, um outro rosto de jasmim?
Porque foges?

Sozinho, o seu silêncio fatigava-me de noite,
quando se alongava diante da minha porta
como se fosse a rua... o velho bairro.
Que a tua vontade seja feita, Rita!
Que o silêncio seja machado,
cercaduras de estrelas
ou terreno propício ao nascimento da árvore.
Eu saboreio o beijo
no fio das lâminas.
Vem, adiramos aos massacres!

Como folhas supérfluas,
os enxames de pássaros
caíram no poço do tempo.
E eu recolho as asas azuis.
Rita,
eu sou a pedra tumular da sepultura que cresce.

Rita,
eu sou aquele em cuja carne
as searas cavam
o rosto duma pátria...


* Morreu no passado dia 9 de Agosto [de 2008], nos Estados Unidos, o poeta palestiniano Mahmud Darwish, aos 67 anos, um dos mais importantes poetas árabes contemporâneos, cuja actividade literária e política o tornaram no poeta nacional da Palestina.
Mahmud Darwish nasceu na Palestina em 1941. Em 1948 a sua aldeia foi atacada pelos sionistas e os habitantes levados para outros lugares. Aos sete anos Darwish fugiu para o Líbano à procura de notícias da sua família que, no entanto, não conseguiu encontrar. Um ano depois o poeta retornou à Palestina, onde encontrou a sua aldeia totalmente arrasada e ocupada pelos israelitas. Darwish escreveu os seus primeiros textos poéticos quando ensinava na aldeia de Der Al Asad. Foi detido e preso pelos israelitas em diversas alturas ao longo da sua infância e adolescência, tendo mais tarde sido proibido de leccionar no ensino superior. Entretanto, foi para Moscovo em 1970, e para o Cairo no ano seguinte. Desde então organizou várias publicações e centros de pesquisa palestinianos. Foi presidente da Sociedade de Escritores e Poetas Palestinianos e foi várias vezes indicado para o Prémio Nobel.
Em Abril de 1988 o então primeiro-ministro Isaac Shamir iniciou uma ofensiva contra Darwish devido ao seu poema "Aqueles que passam entre as palavras passageiras", que, segundo Shamir era "a expressão exacta dos objectivos do bando de assassinos organizados debaixo do guarda-chuva da OLP". Na verdade, o poema é um pedido dirigido aos israelitas para que deixem as terras ocupadas.
Em Abril de 2002 o exército israelita atacou e destruiu o Centro Cultural Jalil Sakatini (Ramalá), dirigido por Darwish. Antes, o edifício tinha sido saqueado pelas forças militares de Israel que levaram arquivos, documentos e obras de arte e a seguir o destruíram com explosões de cargas de dinamite. O edifício também era sede da prestigiosa revista literária palestiniana Al Karmel, também dirigida por Darwish. Horas mais tarde a operação continuou com a invasão da casa do poeta, que residia em Paris, onde continuava a editar a revista literária Al Karmel.
Com livros traduzidos em mais de 20 idiomas e vários prémios internacionais, Mahmud Darwish é o autor da Declaração de Independência Palestiniana, escrita em 1988 e lida por Iasser Arafat quando declarou unilateralmente a criação do Estado Palestiniano.
Darwish ganhou notoriedade ainda nos anos 60, com a publicação do seu primeiro livro "Pássaro sem asas", uma colectânea de poemas que inclui "Bilhete de Identidade". Escrito na primeira pessoa, o poema descreve o momento em que um árabe fornece os números do seu documento de identificação numa barreira israelita, na tentativa de retornar à sua terra.

Em Portugal, a editora Campo das Letras publicou em 2002 o livro "O Jardim Adormecido e Outros Poemas", com selecção e tradução de Albano Martins. Os poemas deste livro foram extraídos dos volumes "La terre nous est étroite et autres poèmes" (antologia organizada pelo próprio poeta, antecedida de um prefácio inédito do autor, publicada, em 2000, pela editora Gallimard), "Plus rares sont les roses" (Les Éditions de Minuit, 1989) e "Poèmes palestiniens" (Les Éditions du Cerf, 1989).
(http://porosidade-eterea.blogspot.com/2008/08/mahmoud-darwish-1941-2008.html)

No poema Os pássaros morrem na Galileia "[…] Rita é a amada israelita, que, desiludida, parte numa viagem em busca da verdade e deixa o poeta para trás. O poema tornou-se numa das canções mais populares da Palestina."
(http://porosidade-eterea.blogspot.com/2008/10/leitura-mundial-de-mahmud-darwich_05.html)