Há uma espécie de restrição, de fechamento na culpabilidade e no mal. Eu não subestimo de forma nenhuma este problema. Mas aquilo que tenho necessidade de verificar é que, por muito radical que seja o mal, não é tão profundo como a bondade. E se a religião, as religiões, têm um sentido, é precisamente o de libertar o fundo de bondade dos homens, de o procurar onde ele está completamente escondido.
Nós andamos sobrecarregados pelos discursos, pelas polémicas, pelo assalto do virtual; hoje há como que uma zona opaca e existe esta certeza profunda a libertar, a resgatar; a bondade é mais profunda que o mal mais profundo. Não basta sentir isto. É preciso dar-lhe uma linguagem. Para mim, a liturgia não é simplesmente uma acção. É um pensamento. Na liturgia encontra-se uma teologia escondida, discreta, que se resume nesta ideia: “A lei da oração é a lei da fé”.
Pertencemos à civilização que efectivamente matou Deus, isto é, que fez prevalecer o absurdo e o sem-sentido sobre o sentido. Eu penso que há nisso um protesto profundo. O protesto situa-se ainda no pólo negativo: diz não ao não. O movimento do protesto para a atestação passa pela oração. Esta manhã os cânticos, as orações tinham a forma do vocativo: “Oh” no exortativo e na aclamação. Penso que aclamar a bondade é o hino fundamental.
Gosto muito da palavra felicidade. Saúdo-a como um reconhecimento nos três sentidos da palavra: reconheço-a como sendo minha, aprovo-a no outro e tenho gratidão por aquilo que dela conheci, essas pequenas felicidades, entre as quais as da memória para me curar das grandes desgraças do esquecimento. (Paul Ricoeur)
domingo, junho 5
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